CRISE DOS REFUGIADOS: UMA ANÁLISE SOBRE O CONFLITO DOS INDESEJADOS NA TERRA DOS ESTABELECIMENTOS

DISCENTE: ILDA LOURENÇO DA SILVA; ORIENTADOR: WENDELL FICHER TEIXEIRA ASSIS

Arquivo
Ilda Lourenço.pdf
Documento PDF (875.9KB)
                    UNIVERSIDADE FEDERAL DE ALAGOAS
INSTITUTO DE CIÊNCIAS SOCIAIS
CURSO DE LICENCIATURA EM CIÊNCIAS SOCIAIS

ILDA LOURENÇO DA SILVA

CRISE DOS REFUGIADOS:
Uma análise sobre o conflito dos indesejados na terra dos estabelecidos

Maceió
2018

ILDA LOURENÇO DA SILVA

CRISE DOS REFUGIADOS:
Uma análise sobre o conflito dos indesejados na terra dos estabelecidos

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao
Instituto de Ciências Sociais da Universidade
Federal de Alagoas, como requisito parcial para
obtenção do grau de graduada em Ciências
Sociais – Licenciatura.
Orientador: Prof. Dr. Wendell Ficher Teixeira
Assis

Maceió
2018

Folha de Aprovação

ILDA LOURENÇO DA SILVA

CRISE DOS REFUGIADOS:
Uma análise sobre o conflito dos indesejados na terra dos estabelecidos
Trabalho de Conclusão de Curso
apresentado ao Instituto de Ciências Sociais
da Universidade Federal de Alagoas, como
requisito parcial para obtenção do grau de
graduada em Ciências Sociais– Licenciatura.
Aprovado em __ / __ / ____

Prof. Dr. Wendell Ficher Teixeira Assis (ICS/UFAL) (Orientador)

BANCA EXAMINADORA

Prof. Dr. Arim Soares do Bem (ICS/UFAL)

Profa. Dra. Vivianny Kelly Galvão (UNIT)

A todos os refugiados que conheci no campo Moria e em
Roraima, cujas histórias de sobrevivência me encorajam a
continuar lutando por esta causa.

AGRADECIMENTOS

Agradeço a Deus por ter me conduzido durante esses anos na graduação. Grata ao
Criador, pois por meio de sua graça e amor eu pude desfrutar de experiências inesquecíveis
no campo de Refugiados que deu origem a esse trabalho, Deus foi do início ao fim fonte de
inspiração em cada palavra registrada aqui.
Agradeço aos meus pais, José Ailton e Vera Lúcia, por todo apoio e paciência, eles
foram extremamente importantes nesse período, me encorajando e me acalmando quando as
coisas pareciam fugir de controle. Os meus agradecimentos se estendem aos líderes da Jocum
Tríplice Fronteira, Mimika e Lucelene, que me acolheram tão bem no período em que estive
em Roraima. Agradeço também aos meus amigos que foram essenciais e me ajudaram de
forma excepcional no processo de construção do trabalho, meus sinceros agradecimentos em
especial a Renato de Souza, Nerissa Farret, Antônio Mitomari e Eliceli Bonan, obrigada por
tudo.
Dedico esse trabalho a cada amigo refugiado que eu pude abraçar, obrigada por
depositarem confiança suficiente em mim a ponto de compartilhar os sonhos, lágrimas e
alegrias comigo. Grata também a Deus pela oportunidade de ter trabalhado no campo de
refugiados na Grécia com uma equipe de missionários que se tornaram parte da minha família,
agradeço à Alesandra Weinschutz, Alejandro Miranda, Viviana Palma, Thaynara Araujo,
Felipe Santos e Roberta Silva por todo apoio e amor que recebi. Minha eterna gratidão e amor
pela vida e empenho dos meus amigos que ficaram em Maceió me ajudando de diversas
formas para que eu tivesse a oportunidade em viajar para Europa e o Norte do Brasil, sem
dúvida alguma, eu não conseguiria ir sem o apoio de vocês, em especial toda minha gratidão
às minhas melhores amigas Joyce Gusmão, Rebeca Santos e Débora Santos.
Agradeço ao meu orientador, Wendell Ficher, por todo suporte, zelo, paciência e pela
excelência em ter me instruído durante o desenvolvimento do trabalho e por caminhar comigo
durante esses meses de pesquisa e análises. Obrigada por acreditar em mim.

Quando vim da minha terra,
Se é que vim da minha terra
(Não estou morto por lá?),
a correnteza do rio
me sussurrou vagamente
que eu havia de quedar
lá donde me despedia.
Os morros, empalidecidos
no entrecerrar-se da tarde,
pareciam me dizer
que não se pode voltar,
porque tudo é consequência
de um certo nascer ali.
Quando vim, se é que vim
de algum para outro lugar,
o mundo girava, alheio
à minha baça pessoa,
e no seu giro entrevi
que não se vai nem se volta
de sítio algum a nenhum.
Que carregamos as coisas,
moldura da nossa vida,
rígida cerca de arame,
na mais anônima célula,
e um chão, um riso, uma voz
ressoam incessantemente
em nossas fundas paredes.
Novas coisas sucedendo-se
iludem a nossa fome
de primitivo alimento.
As descobertas são máscaras
do mais obscuro real,
essa ferida alastrada
na pele de nossas almas.
Quando vim da minha terra
não vim, perdi-me no espaço,
na ilusão de ter saído.
Ai de mim, nunca saí.
Lá estou eu, enterrado
por baixo de falas mansas,
por baixo de negras sombras,
por baixo de lavras de ouro,
por baixo de gerações,
por baixo, eu sei, de mim mesmo,
este vivente enganado,
enganoso.
(A Ilusão do Migrante-Carlos Drumond de Andrade)

RESUMO

Os conflitos envoltos da diáspora de pessoas oriundas dos mais diversos países em busca de
refúgio, devido à violência generalizada tem instalado na sociedade contemporânea
sentimento de medo, insegurança. A mídia por sua vez, através das notícias divulgadas pelos
meios de comunicação, acentua a construção do “outro” que atravessa a fronteira e nada se
sabe de sua história, a não ser as histórias já compartilhadas como um indivíduo indesejado.
O presente trabalho tem como objetivo analisar como se dá a construção e a personificação
do refugiado como ameaça. Procura-se compreender como a mídia tem se tornado o principal
meio de influência social, bem como elucidar quais mecanismos são utilizados para reforçar
os estereótipos construídos acerca dos grupos refugiados. Para isso, nos debruçamos na análise
de recortes jornalísticos, que, por sua vez, são complementados pela experiência de campo
vivenciada em Roraima, que tem sido nos últimos anos receptáculo de refugiados
venezuelanos. Nesta pesquisa iniciamos fazendo um recorte internacional, para assim
compreendermos a crise de refugiados no contexto social brasileiro.

Palavras-chave: Refugiado, Biopoder, Deslocamento forçado

ABSTRACT

The conflicts involved in the diaspora of people from various countries in search of refuge,
because the widespread of violence have installed in contemporary society a sense of fear,
insecurity, what is accentuating through the news disseminated by the media. Thus starts the
construction of the "other" which crosses the border and nothing is known of its history, except
the stories already shared in the media as an unwanted individual. The present work aims to
analyze how the construction and the personification of the refugee takes place as a threat. It
seeks to understand how the media has become the main means of social influence, as well as
elucidate what mechanisms are used to reinforce the stereotypes built on refugee groups. To
that end, we focus on the analysis of newspaper clippings, which, in turn, are complemented
by the field experience in Roraima, which in recent years has been a receptacle for Venezuelan
refugees. In this research we began by making an international cut, so as to understand the
refugee crisis in the Brazilian social context.

Key words: Refugees, Biopower, Forced Displacement

LISTA DE GRÁFICOS
Gráfico 01 – Dados Estatísticos de Refugiados no Mundo – p.22
Gráfico 02 – Países que recebem mais Refugiados – p. 22
Gráfico 03 – Solicitação de Refúgio – Venezuelanos (2010-2016) – p. 34
Gráfico 04 – Solicitação de reconhecimento da Condição de Refugiado em 2017 – p.47
Gráfico 05 – Solicitação de Reconhecimento da Condição de Refugiado por Unidade
Federativa em 2017 – p. 48.

LISTA DE ABREVIAÇÕES E SIGLAS
ACNUR – Alto Comissariado das nações Unidas para os Refugiados
ANUAR – Administração das Nações Unidas para o Auxílio e Restabelecimento
OIR – Organização Internacional para os Refugiados
ONU – Organização das Nações Unidas
CONARE – Comitê Nacional para Refugiados
OAB – Ordem dos Advogados do Brasil
SJMR – Serviço Jesuíta de Migração e Refugiado

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ...................................................................................................................12

CAPÍTULO 1:

A PROBLEMÁTICA DOS REFUGIADOS EM TERRITÓRIO

NACIONAL .........................................................................................................................15
1. Uma breve análise sobre os refugiados como fenômeno internacional .....................15
1.2 Refugiados sírios e o crescimento dos deslocamentos internacionais .......................21
1.3 A questão dos refugiados no Brasil ............................................................................28
CAPÍTULO 2: O PROCESSO DE CONCESSÃO DE ASILO NO BRASIL................. 37
2.1

Convenção de 1951- Um olhar sobre o Estatuto dos Refugiados ...........................37

2.1.1 Sobre as Disposições Gerais da Convenção de 1951 ............................................. 38
2.1.2 Protocolo de 1967 ....................................................................................................40
2.2 Declaração de Cartagena e o refúgio no Brasil .........................................................40
2.3

Nova Lei de Migração e suas implicações ...............................................................43

CAPÍTULO 3: DA CONSTRUÇÃO DO IMAGINÁRIO SOCIAL ...............................51
3.1 Biopoder como agente normalizador do conflito ........................................................51
3.2 A influência da mídia como mecanismo de biopoder na construção da imagem do
refugiado ..........................................................................................................................52
3.3 O Refugiado apresentado pela mídia e o impacto em sua inserção na comunidade
acolhedora ........................................................................................................................58
CONSIDERAÇÕES FINAIS ........................................................................................61
BIBLIOGRAFIA ...........................................................................................................63

12

INTRODUÇÃO
Em 2016 fiz um curso missionário na organização religiosa JOCUM (Jovens Com
Uma Missão), cujo objetivo prático era formar pessoal habilitado para receber refugiados
oriundos da Ásia, África e Oriente Médio, que desembarcavam na Ilha de Lesvos na Grécia.
O desempenho no curso me habilitou a trabalhar como voluntária em um campo de refugiados
localizado naquela ilha grega durante o período de 03 de novembro a 03 de dezembro. Lesvos
havia recebido só em janeiro de 2016 cerca de 20 mil refugiados, porém não havia campos de
assentamentos suficientes para abrigar essas pessoas, assim, em caráter emergencial um
presídio desativado foi utilizado pelo governo para abrigar esses deslocados. O campo Moria
que tem capacidade para 3.500 pessoas, naquele período onde estive trabalhando, tinha dentro
do espaço aproximadamente 5 mil refugiados. A superlotação era visível, muitos dormiam em
barracas em condições sub-humanas, além disso, tinham ainda que enfrentar comportamentos
xenofóbicos de alguns moradores. Foi na ilha grega, ao ir ao mercado e fazer atividades mais
simples do dia a dia que observei o olhar de rejeição dos donos de mercearias e moradores.
Os nativos da ilha justificavam a reprovação quanto à presença dessas pessoas pelo fato de
que por culpa deles o turismo e a economia havia sido afetada.
Ao retornar ao Brasil continuei incomodada ao constatar que a imagem do refugiado
permanecia sendo construída e associada à raiz de todo o problema social. Em 2017 a crise na
Venezuela desencadeia um salto na quantidade de pessoas que se deslocam para o Brasil em
busca de refúgio. Com isso, tornou-se mais evidente os argumentos de preconceito e
insatisfação que se ouvia a respeito da crise. As justificativas eram as mesmas que os
moradores de Lesvos utilizavam; o refugiado não era bem vindo, e para os nativos, todo aquele
que ajudasse essas pessoas se tornaria um traidor nacional. O acirramento da crise dos
refugiados no norte do Brasil aguçou meu interesse e em julho de 2018 estive em Roraima
durante um período de 13 dias trabalhando com a JOCUM Tríplice Fronteira. A organização
tem realizado trabalhos sociais em apoio aos venezuelanos que estão vivendo atualmente em
abrigos na cidade de Boa Vista, como também em apoio aos venezuelanos que têm vivido nas
ruas. Diferentemente da Grécia, os moradores de Boa Vista já possuíam uma relação
conflituosa com os venezuelanos, contudo, esse atrito tem se agravado na medida em que
cresce o número de pessoas cruzando a fronteira. A precariedade no atendimento de serviços
públicos básicos e a escala de ações violentas, ambas reforçadas por ações xenofóbicas, têm
gerado confronto entre a população estabelecida e os recém-chegados.

13

Diante disso, percebi a necessidade em trazer todos esses desconfortos observados
no campo para o ambiente acadêmico, a fim de discutir a respeito do fenômeno social, e o
envolvimento da mídia nesse processo e suas implicações no contexto social brasileiro. Desse
modo, esse trabalho se estrutura da seguinte forma; no primeiro capítulo intitulado “A
problemática dos Refugiados em território nacional”, discutiremos por meio de uma breve
análise como esse fenômeno tem se configurado ao longo do tempo, bem como o
desenvolvimento de mecanismos jurídicos que tinham como objetivo conter o crescente fluxo
de deslocados, recorrendo à criação de órgãos específicos que tratassem essa problemática
com base na premissa de efetivar a contenção do fluxo de migrantes e refugiados indesejados.
Com o aumento dos conflitos após Primeira Guerra Mundial, passa a ser arquitetado o
emprego de documentos que tornassem possível o deslocamento dos refugiados para outros
países.
Outro marco para que a crise de deslocamentos de pessoas recebesse uma atenção da
comunidade internacional está pautado nos acontecimentos pós Segunda Guerra Mundial. Em
decorrência dos resultados da guerra foi necessária a formação de um órgão que estivesse
responsável em solucionar a problemática voltada para os deslocados de guerra. No mesmo
capítulo abordamos a respeito da crise de refugiado na síria, analisando a gênese desse
conflito, tendo em vista que os refugiados sírios tornaram-se a representação numa esfera
macro a respeito dessa crise que atinge a contemporaneidade. Assim como a crise de
refugiados internacionais não é um fenômeno recente, abordamos no último tópico deste
capítulo a respeito da crise numa esfera nacional, para assim compreendermos que a gênese
da história social brasileira é marcada por deslocamentos forçados, aqui analisamos a inclusão
de dispositivos que reconhecem essas pessoas de forma legal, ressaltando a necessidade de
proteção a essas vítimas.
No segundo capítulo “Processo de Concessão de asilo no Brasil”, apresentamos os
documentos elaborados e sua importância no cenário da crise, analisando os dispositivos que
discutem a respeito da urgência em atender as necessidades dessas pessoas de forma jurídica
e legal, discutiremos sobre suas implicações na sociedade, destacando a Nova Lei de Migração
de autoria do senador Aloysio Nunes (PSDB-SP), e como essa lei possui em sua praticidade
uma ambivalência. Se por um lado ela traz benefícios em garantir a seguridade da pessoa
refugiada, ela também reforça o estigma dos cidadãos autóctones de que a nova lei seria um
mecanismo que facilita a inserção do refugiado na esfera pública e com isso as oportunidades

14

que outrora deveriam ter como prioridade o brasileiro, passam a priorizar aquele que vem de
longe.
Apesar desses documentos jurídicos definirem como deve ocorrer o processo de
integração social da pessoa refugiada, observaremos ao longo do capítulo a problemática
enfrentada na execução de seus dispositivos. A precariedade quanto a efetivação da lei tem
feito com que os refugiados, principalmente de origem venezuelana, busquem soluções
clandestinas para permanecerem no país, acarretando assim no aumento da exploração de mão
de obra barata. Observaremos por fim que as leis que aqui foram expostas acabam
funcionando como armadilhas jurídicas cuja operacionalidade realça os mecanismos de
dominação que acentuam a segregação social vigente.
No terceiro capítulo intitulado “Da construção do imaginário social” discorreremos
sobre como se dá a construção da imagem do refugiado como um perigo à segurança social.
A análise estará pautada no conceito de biopoder, que nos lega a possibilidade de percebermos
que o poder não se limita a um único espaço social, ao contrário disso perpassa as mais
variadas instituições, sendo ele um elemento onipresente, encontrado em todas as esferas
sociais (Foucault, 1987). No mesmo capítulo analisaremos como a influência da mídia nesse
processo de construção reforça a presença do refugiado como alguém indesejado. Os meios
de comunicação serão percebidos ao longo do capítulo como um instrumento que define a
realidade e molda as opiniões dos seus atores sociais a partir da ideação através da qual a
mídia apresenta esse fenômeno e suas vítimas. O impacto causado pela apresentação do
refugiado por meio da mídia contribui para que novos desafios surjam dificultando a inserção
do outsider à comunidade receptora.

15

CAPÍTULO 1: A PROBLEMÁTICA DOS REFUGIADOS EM TERRITÓRIO
NACIONAL
1.1

Uma breve análise sobre os refugiados como fenômeno internacional
A Segunda Guerra Mundial (1939-1945) representa um acontecimento histórico e

social para o crescimento do fluxo migratório em todo o mundo, como também para os direitos
humanos, julgando que no período da Segunda Guerra, especialmente na Alemanha Nazista,
foi convalidado um dos maiores atos de barbaridade contra o ser humano. A maioria dos casos
de refúgio registrados neste período refere-se aos regimes totalitários vigentes na época,
caracterizados por perseguições à determinados grupos étnicos. Como exemplo desses
acontecimentos, pode-se destacar a condição da Alemanha nazista em relação aos judeus que
fugiram, após o término da guerra. Diante do exposto, houve uma preocupação internacional,
cuja motivação estava centrada na preservação da dignidade e direito da pessoa humana.
Diante das batalhas travadas, e considerando o cenário em que a Europa se
encontrava, havia crescido uma demanda de trabalho, e, em virtude disto, acentua-se a
escassez de mão de obra barata, fazendo surgir o crescimento pela busca de trabalhadores em
todo o mundo. Segundo HAYDU (2000), nessa fase é possível observar a formação de dois
tipos de grupos de migrantes. O primeiro trata-se dos judeus, os quais logo no início do
conflito foram exilados para além da fronteira alemã, após serem expulsos de suas
propriedades, tornando-se os judeus apátridas. O segundo grupo refere-se aos nacionais, ou
seja, homens e mulheres que em razão do contexto de conflito que o mundo enfrentava,
tiveram que abandonar seu país de origem. Esse grupo é composto por pessoas que sofreram
perseguição devido ao posicionamento político, escolha religiosa e questão racial, estes, por
sua vez, não contavam com a proteção do Estado.
Em relação especificamente aos refugiados, foi verificado um crescimento
significativo no deslocamento de pessoas. Em meio aos dois maiores eventos do século XX,
ou seja, as duas Grandes Guerras, os refugiados passaram a configurar um fenômeno
contemporâneo munido de uma dimensão global. É justamente em meados do século XX que
os Estados que compõem o sistema internacional passam a reconhecer a evasão motivada pelo
medo de perseguição religiosa, catástrofe ambiental, perseguição em função racial,
posicionamento político e nacionalidade, como um direito que deve ser assegurado e

16

preservado por uma legislação internacional. A situação dos deslocados passou a ser
observada como uma questão política no período, no qual os Estados Unidos e União Soviética
se enfrentavam, a fim de consolidarem suas posições de superpotências. Considerando esse
contexto de luta entre EUA e URSS a Organização das Nações Unidas, aparece representando
um papel decisório nessa questão dos deslocados (REIS, 2010).
É de suma importância atentarmos para a ressignificação sociológica do conflito,
para podermos compreender a luta por reconhecimento desses deslocados. Se outrora
conforme BIRNBAUM (1995) o conflito era visto como uma fonte, cuja relação estava
pautada na divisão do trabalho, agora o conflito passa a ser visto como “normal”, como um
agente regulador social, o qual não se sabe se cessará. Perdendo assim seu caráter patológico,
sendo posto como um conceito analítico inerente à estrutura social. Isso é nítido, quando a
população em questão passa a pegar em armas para defender um bem social comum. Contudo,
suas consequências refletem no deslocamento massivo, como também na nova adaptação e
busca por reconhecimento dos recém-chegados em terras estranhas. Esses deslocamentos
geram fragilidades na estrutura do Estado cuja desestabilização tem como fio condutor as
relações de poder, isso quer dizer que a relação com os refugiados transita da tentativa
frustrada que buscava coibir ou bloquear esse fluxo, para um controle sobre os corpos que se
materializa nas estratégias estatais de classificação, domesticação, circunscrição regional,
limitação de trânsito.
Os critérios que estabelecem o reconhecimento do refugiado podem ser interpretados
como um modelo panóptico, que controla o comportamento de seus sujeitos como uma ação
disciplinar, tendo como instrumento a vigilância. As diretrizes e normas formuladas para
conterem o fenômeno migratório operam como instrumento de poder, o qual irá estabelecer
formas de comportamentos numa ótica generalizada, sem levar em consideração a
individualidade de cada um dos refugiados. Em Boa Vista trabalhei em um abrigo de
refugiados, o qual possui cerca de 598 refugiados venezuelanos, para que haja um controle
mais efetivo de fiscalização e boa convivência é aplicado a essas pessoas 04 normas básicas
para convívio
1- O morador do abrigo não pode sair entre 00:00h e 05h30 da manhã
2- É proibida a entrada de pessoas que não são moradoras do abrigo
3- Proibido utilização de drogas ou porte de armas
4- É proibido entregar alimento a pessoas que estão fora do abrigo

17

O Exército trabalha dentro desses espaços que abrigam os venezuelanos. Os soldados
são responsáveis em manter a ordem e a boa convivência entre os refugiados. Todos os
moradores possuem uma carteira onde há informações necessárias a respeito do morador,
como nome, idade, tenda em que mora, ao sair do abrigo a pessoa é obrigada a mostrar o
documento ao soldado, onde ele irá conferir o nome e verificar se a foto no documento
corresponde à pessoa que o carrega. Ao retornar para o abrigo, o indivíduo tem que realizar o
mesmo procedimento. Uma grande parte dos venezuelanos que estão dentro dos abrigos
possuem empregos formais e informais em Boa Vista.
Foucault (1998) recusa a ideia de que o poder seja apenas um mecanismo de
repressão, segundo ele o que mantém o poder é justamente as coisas que ele produz, não é
apenas uma força, mas um dispositivo de diálogo que transpassa, dissolve e se impregna em
toda a estrutura social. Isto é, o poder é um dispositivo que regra as práticas e discursos
institucionais. Esse raciocínio ilumina as cenas observadas em Roraima durante minha estada
entre os refugiados. No abrigo indígena, coordenado pela Federação Humanitária
Internacional1, vivem os índios Warao, que foram os primeiros venezuelanos que chegaram a
Boa Vista em dezembro de 2016. Contudo, a presença indígena não causou nenhum impacto
aos moradores, isso só aconteceu quando os demais venezuelanos começaram a chegar. Assim
como nos demais abrigos, o exército era o responsável por preparar e distribuir os alimentos.
Porém, o desempenho dessa atividade por parte dos militares começou a produzir atritos, uma
vez que na visão dos Warao a atuação do exército brasileiro representava uma afronta à sua
autonomia e um controle sobre o próprio alimento, com isso e para manter a vigilância em
outras frentes, foi reservado um espaço onde os próprios indígenas podem cozinhar. O cacique
é agora o responsável por diariamente fazer a distribuição das três refeições para cada família.
Algumas vezes surgem reclamações de que a divisão de alimentos não foi feita da forma
correta, contudo, isso é o menor dos problemas. Para todos da fraternidade e também para os
índios, essa é uma forma justa que os respeita no cuidado do próprio alimento.
Essas microestratégias de controle tem seu correspondente mais estrutural e foi
justamente com objetivo de conter uma sublevação em torno dos deslocamentos de refugiados,
que visivelmente estavam fora de controle durante o pós-primeira guerra, que se desencadeou
nos países europeus uma iniciativa que visava à criação de mecanismos protetivos que fossem
capazes de bloquear esse contingente de pessoas deslocadas em seu território de origem,

1

Federação Humanitária Internacional. https://www.fraterinternacional.org/nossa-historia-fraternidadefederacao-humanitaria-internacional/. Acesso em 11 de setembro de 2019.

18

acarretando, portanto, na elevação do número de refugiados no início de 1920. Essas práticas
de securitização não só vigiam o outsider, como também os reprimi e os limita, tornando-os,
portanto, objetos de tais mecanismos. É a norma capaz de estabelecer a relação entre o
elemento disciplinar e o elemento regulador (DANNER, 2010). A ação de um estado de
exceção tornou-se regra diante dessa problemática que está longe de ter seu fim. De acordo
com Braga (2011) a aplicabilidade de dispositivos que elidem o estatuto desses outsiders
tornou-se comum, a justificativa para essa ação está fundamentada em argumentos que
ressaltam um perigo externo, o qual colocará a sociedade receptora em uma condição de risco
na segurança de seus estabelecidos. Em decorrência dessa preocupação, é a partir de 1921 que
a Liga das Nações2 funda o escritório do Alto Comissariado das Nações Unidas para os
Refugiados - ACNUR3, o qual passa a ser responsável por esses deslocados. Regularizando o
fluxo de refugiados, assim, objetivando uma redução dessa massa, visando o controle do fluxo
deste fenômeno social.
O ACNUR é considerado como uma das principais agências humanitárias de caráter
apolítico e social, que busca elucidar impasses no que diz respeito às questões acerca dos
refugiados. Tendo também como objetivo a proteção destes. De acordo com informações
divulgadas e disponíveis no site do Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados,
após a Primeira Guerra Mundial ocorreu a organização da repatriação de aproximadamente
450 mil refugiados para mais de 26 países diferentes de seus países de origem4. Em 1922, com
a eclosão de uma guerra entre Grécia e Turquia, cerca de dois milhões de pessoas tornaramse refugiadas. Com isso, emerge a necessidade de se produzir um documento que permitisse
ao refugiado e apátrida seu deslocamento para outro país sem correr risco de ser proibido de
retornar para seu país de origem. Dessa forma, foi elaborado o Passaporte Nansen 5,

2

Liga das Nações é fundada após a Primeira Guerra Mundial. Seu objetivo era se tornar um organismo que
tivesse como primazia a mediação dos conflitos internacionais e sua resolução. Foi fundada em 1919,
conseguindo consolidar tratados de segurança entre as potências como também mediar conflitos acentuados
naquela época. Serviu de modelo para ONU. Disponível em: https://onu70anos.wordpress.com/2015/05/27/daliga-das-nacoes-a-organizacao-das-nacoes-unidas/. Acesso em: 14 de dezembro de 2017.
3
Ainda em 1921 as atividades do escritório do Alto Comissariado das Nações Unidas Para Refugiados (ACNUR)
estavam limitadas apenas ao atendimento de grupos específicos, sendo eles as vítimas da guerra civil da Rússia.
De forma gradativa, foi abrangendo para os refugiados da Grécia, Turquia, Bulgária e da Armênia
(SILVA, 2011).
4
Uma Celebração do 150º aniversário de Fridtjof Nansen 2012. Disponível em:
http://www.acnur.org/portugues/o-acnur/envolva-se/eventos/arte-e-refugio-no-brasil/. Acesso em: 16 de jan. de
2018.
5
Fridtjof Nansen, um famoso explorador polar, como “Alto Comissário em nome da Sociedade das Nações para
tratar dos problemas dos refugiados russos na Europa” foi um dos responsáveis pela criação do ACNUR,
designado em coordenar ajuda internacional. Disponível em: http://www.acnur.org/portugues/informacaogeral/premio-nansen/fridtjof-nansen/.

19

possibilitando essa mobilidade sem acontecer qualquer interferência. Ressalta-se que durante
o século XX, conforme TZASCHEL (2012) havia um embate quanto à definição entre
refugiado e apátridas, considerando que a distinção entre esses dois termos era uma das
problemáticas enfrentadas pelas instituições que visavam à seguridade dos direitos humanos
sob essa classe de deslocados. Logo, as medidas que visavam uma proteção para essas vítimas
eram efetuadas de forma única, buscando assim uma solução para o problema que era vigente
na época.
A problemática em torno da identificação de quem seriam os apátridas ou refugiados
refere-se ao tratamento que ambos deveriam receber. Contudo, por haver esse empecilho
quanto à exatidão na identidade dessas vítimas, os instrumentos legais desenvolvidos naquela
época eram moldados, a fim de que pudessem contemplar esses dois casos distintos,
objetivando a preservação do bem-estar de ambos. Os deslocamentos forçados e o crescente
fluxo migratório têm se configurado como uma realidade social complexa. Conflitos e
perseguições religiosas tem acarretado em um crescente fluxo de pessoas em busca de refúgio
e com isso um crescimento expressivo de violência, medo, preconceito, indiferença e
desrespeito à dignidade humana. Ao fim da Primeira Guerra Mundial, um número
significativo de refugiados chegou a Europa e, a partir desse momento, inicia-se uma
discussão sobre direitos básicos para as pessoas apátridas e refugiados em busca de proteção.
Em 1943, com a movimentação de pessoas vítimas da II Guerra Mundial, as quais
buscavam um local seguro para se refugiar, fez com que os países aliados voltassem à
preocupação em como manter a ordem diante do caos que assolava a época. No mesmo ano
foi estabelecido um órgão responsável em conter a sublevação não apenas voltado para os
refugiados, mas para todos aqueles deslocados da guerra. Então, sob essa responsabilidade foi
outorgada a incumbência à Administração das Nações Unidas para o Auxilio e
Restabelecimento (ANUAR).
A ANUAR delimitou atividades que realizavam o repatriamento dessas pessoas,
porém, muitas dessas vítimas sobreviventes dos conflitos recusaram-se a retornar ao local de
origem, principalmente aos países que eram governados pelo regime comunista. Apesar da
resistência dessas pessoas, segundo ACNUR (2002, p.14) elas foram repatriadas,
desconsiderando seus desejos pessoais. Tal ação reflete a expansão do micro poder sob o corpo
social. Tendo como um dos métodos a aplicabilidade da disciplina, a qual é efetuada sobre as
vontades do sujeito, garantindo “a obediência dos indivíduos, mas também uma melhor
economia do tempo e dos gastos” (FOUCAULT, 2008, p.126).

20

De acordo com o ACNUR (2002) em maio de 19456 cerca de 40 milhões de pessoas
encontravam-se deslocadas na Europa. Dessa forma, havia o crescimento de um novo
movimento de refugiados, aproximadamente, 07 milhões de pessoas foram repatriadas, sendo
02 milhões somente de soviéticos. Com isso, iniciou um descontentamento dos Estados
Unidos, que afirmavam que o ANUAR estava fortalecendo as forças soviéticas. Por ser
responsável por 70% do financiamento do órgão, os EUA passaram a cobrar a formulação de
um novo órgão que pudesse atender as necessidades dos refugiados, diferentemente do método
adotado pelo ANUAR, assim, foi negado pelos EUA o financiamento na prorrogação do
mandato do órgão, exigindo a substituição definitiva da ANUAR.
Em julho de 1947 a ANUAR passa a ser substituída pela agência não permanente da
ONU, a Organização Internacional para os Refugiados (OIR) 7, sendo responsável em dar
assistência somente a pessoas refugiadas, foi também a primeira organização a trabalhar com
todos os aspectos que se referiam a problemática de refugiados. Sua função estava centrada
no registro e classificação dos mesmos, cuidado e assistência, proteção jurídica e política,
transporte, reinstalação e reintegração dessas pessoas (ACNUR, 2002, P.17). Diferentemente
do ANUAR a OIR trabalhava com a política de reassentamento em outros países, o trabalho
da OIR, segundo ACNUR, possibilitou o repatriamento de 73 mil pessoas, e reassentou mais
de um milhão, sendo essas pessoas recebidas na Austrália, Israel, Canadá, como também
países da América Latina. Entretanto, a OIR não obteve êxito na condução da resolução da
problemática dos refugiados, em 1951 o número de deslocados na Europa era cerca de 400
mil pessoas, e seu mandato expirava em 1952. Havia uma concordância entre os países aliados
em manter o órgão, contudo, o desentendimento surgiu quando os objetivos não foram
alcançados pela OIR (ACNUR, 2002, p.19).
O final da década de 1940 é marcado por grandes acontecimentos internacionais,
novos conflitos em torno da humanidade resultaram em novos fluxos de refugiados os quais
reforçavam que a questão dos refugiados não se tratava de algo temporário, e não se limitava

6

A Segunda Guerra Mundial é marcada pela produção de exclusão e intolerância contra o ser humano, sendo
resultado do período de conflito que a Europa enfrentou, marcada também como a época de uma sociedade
disciplinar, a exemplo disto, temos o holocausto que representa uma das maiores atrocidades já realizadas pelo
homem. Um dispositivo, cujas técnicas de vigilância e punição eram visíveis sobre aqueles que recebiam as
sanções pelas suas ações FOUCAULT (2008, p.143).
7
Em 1947 foi criada a Organização Internacional para os Refugiados (OIR), que tinha como objetivo principal
elucidar questões pertinentes aos refugiados da Segunda Guerra Mundial. Refúgio no Brasil: A proteção
Brasileira aos refugiados e seu impacto nas Américas. Disponível em: http://www.acnur.org/portugues/wpcontent/uploads/2018/02/Ref%C3%BAgio-no-Brasil_A-prote%C3%A7%C3%A3o-brasileira-aos-refugiadose-seu-impacto-nas-Am%C3%A9ricas-2010.pdf. Acesso em 17 de maio de 2018.

21

geograficamente aos acontecimentos na Europa. Com a criação do ACNUR e a promulgação
do Estatuto, cujos dispositivos descreviam as funções da organização, onde sua principal
função refere-se à proteção internacional dos refugiados, elaboração de mecanismos que
solucionem tal problemática, como também, auxiliando os governos quanto à aprovação da
integração local da comunidade que o refugiado estaria sendo inserido.
Desde a elaboração do ACNUR, o organismo tem buscado desenvolver mecanismos
que possam atender as necessidades individuais dessas vítimas. Atualmente, o ACNUR dispõe
de programas voltados para mulheres, crianças e idosos, e programas que buscam elucidar a
problemática não só dos refugiados, mas dos deslocados internos, apátridas e solicitantes de
refúgio, objetivando desta maneira atender cada vítima de acordo com sua necessidade.
1.2

Refugiados sírios e o crescimento dos deslocamentos internacionais
Os fluxos de refugiados e migrantes não são um fenômeno recente, como já discutido

na sessão anterior. Esses eventos têm seguido o desenvolvimento da era moderna, o número
crescente deste fenômeno faz surgir uma nova demanda que deve ser suprida, com isso é posto
sob responsabilidade da comunidade internacional que ofereçam suporte de ajuda humanitária
a essas vítimas. De acordo com nota divulgada pelo site G18, em 2017 cerca de 1,2 milhões
de refugiados receberam apoio, entre eles o percentual de 40% registra o número de sírios que
necessitariam de atenção internacional.
Em 2011 ocorreram na Síria manifestações contra o governo do presidente Bashar
Al Assad, onde a população reivindicava liberdade política, reformulação a respeito dos
direitos humanos e reformas na constituição do país. Tais reivindicações foram negadas pelo
presidente, causando no país uma das crises mais violentas da contemporaneidade. Em 2015
o número de sírios em busca de refúgio em países vizinhos foi de 04 milhões, o número
exorbitante revela a maior crise de refugiados do mundo (ACNUR 2015)9. Cerca de 7,6
milhões de sírios estão deslocados na Síria, em junho de 2015 aproximadamente 24 mil sírios

8

Em seis anos de conflito, número de refugiados sírios supera a barreira de 5 milhões. Disponível em:
https://g1.globo.com/mundo/noticia/numero-de-refugiados-sirios-supera-a-barreira-de-5-milhoes.ghtml. Acesso em 06 de Março de 2018.

9

ACNUR:
Refugiados sírios
já
passam
dos
4
milhões.
Disponível
em:
http://www.acnur.org/portugues/noticias/noticia/acnur-refugiados-sirios-ja-passam-dos-4-milhoes/. Acesso em
22 de jan. 2018.

22

adentraram na Turquia, tornando-se assim, um dos países que mais acolhem refugiados
oriundos da Síria, logo, os sírios representam cerca de 45% dos refugiados em região turca.
O ACNUR disponibilizou em seu site os dados estatísticos referentes ao crescimento
deste fenômeno social. As informações apresentadas mostram a ascensão dessa crise
humanitária desde o desdobramento das manifestações civis ocorridas na Síria, até o ano de
2016. Abaixo, os gráficos demonstram a ascensão da crise de refugiados pelo mundo e quais
são os países que mais recebem essas vítimas.
Gráfico 1 – Dados Estatísticos de refugiados no Mundo
65,30 Mi

65,60 Mi

2015

2016

59,50 Mi
51,20 Mi
42,50 Mi

45,10 Mi

2011

2012

2013

2014

Números de Refugiados deslocados (em milhões)

Fonte: ACNUR. Elaboração da autora.

Gráfico 2 – Países que recebem mais refugiados

Jordânia
Etiópia
Irã
Líbano
Paquistão
Turquia

664 mil
736 mil
979 mil
1,1 Mi
1,6 Mi
2,5 Mi

FONTE: Estadão, matéria divulgada em 01 de fevereiro de 2017. Elaboração da autora.

23

Segundo informações divulgadas no site do G110 em julho de 2015,
aproximadamente 1.805.255 refugiados sírios encontravam-se na Turquia, 1.172.753 no
Líbano, 629.128 na Jordânia, 249.726 no Iraque, 132.375 no Egito e 24.055 em países do
norte da África. Nesses dados não foram inclusos os dados estatísticos dos solicitantes sírios
que se encontram em território europeu, o qual corresponde a um total de 270 mil solicitantes
de refúgio. Em virtude do conflito que ainda perdura, segundo ACNUR11, cerca de 1,3 milhão
de sírios deslocaram-se em 2017. Estima-se que esse número represente uma média de 7.000
pessoas deslocando-se diariamente. O ACNUR alerta sobre a necessidade de uma assistência
maior da comunidade internacional, ressaltando que por ser a maior crise de refugiados, o
envolvimento na contribuição por uma solução não pode partir apenas dos países vizinhos. O
apoio e a responsabilidade não devem ser delimitados para alguns países, é vital que a
comunidade internacional participe na subvenção e acompanhamento de programas
governamentais que deem subsídio a essas vítimas. Conforme salienta o ACNUR:
A comunidade internacional tem a responsabilidade de não
poupar esforços para trazer paz e estabilidade à Síria, a fim de
que as condições para retornos voluntários e sustentáveis possam
ser criados. Enquanto isso é inadiável que continuemos a
acompanhar de perto a situação e apoiar os governos que
acolhem essas pessoas por meio de investimentos em programas
voltados para refugiados e em suas comunidades de acolhida,
compartilhando responsabilidades com esses países que
enfrentam a crise síria na linha de frente. (ACNUR, 20 de
outubro de 2017).

O Relatório de Tendências Globais12 (Global Trends) aponta que em 2015 foi
atingido um número recorde de deslocados. No final de 2014 o número de pessoas sendo
forçadas a deixarem suas casas foi de 59,5 milhões se comparado ao número de 51,2 milhões
contabilizados no final do ano de 2013, o qual no mesmo período registrava o maior número

10

Número
de
refugiados
sírios
supera
recorde
e
chega
a
4
milhões,
diz
ONUhttp://g1.globo.com/mundo/noticia/2015/07/numero-de-refugiados-sirios-supera-recorde-e-chega-a-4milhoes-diz-onu.html. Acesso em 08 de março de 2018.
11

O mundo não deve dar as costas à crise de refugiados da Síria. Disponível em:
http://www.acnur.org/portugues/noticias/noticia/o-mundo-nao-deve-dar-as-costas-a-crise-de-refugiados-dasiria/. Acesso em 08 de março de 2018.

12

Relatório do ACNUR revela 60 milhões de deslocados no mundo por causa de guerras e conflitos. Disponível
em:
http://www.unhcr.org/2014trends/#_ga=2.63541161.786229269.1516449187-717429506.1494770659.
Acesso em: 20 de jan. 2018.

24

de pessoas deslocadas em um único ano, sendo totalizado cerca de 8,3 milhões de pessoas. De
acordo com o relatório da ONU13, o número de deslocados tem crescido em todo o mundo,
sendo eles resultado dos conflitos (aproximadamente 15 conflitos) que ocorreram entre os
anos de 2010-2015 nos continentes africano, europeu e asiático. No ano de 201014 houve um
número expressivo de deslocamentos massivos, milhões de pessoas foram afetadas pelo
conflito político que assolava alguns países do continente africano, entre os mais afetados
destacam-se a Líbia e Costa do Marfim. Devido a uma guerra civil iniciada após as eleições
de 2010, onde Laurent Gbagbo ter perdido as eleições para Alassane Ouattara, negou-se abrir
mão da presidência, os defensores do governo de Ggabo iniciaram manifestações contra a
vitória de Ouattara. Cerca de 700 mil pessoas foram deslocadas dentro da Costa do Marfim,
devido à violência massiva no período pós-eleitoral ocorrida no ano de 2010, e em 2011 cerca
de 100 mil15 pessoas foram obrigadas a abandonar o país.
Na Líbia 25 mil pessoas se deslocaram do país, tais deslocamentos são resultado dos
protestos contra o regime do ditador Muammar Kadhafi16, o qual governava o país desde 1969,
a onda de conflito que assolou o país em 2010 causou a morte de milhares de pessoas, as
manifestações foram transformadas em uma guerra civil. De acordo com os dados informados
pelo Global Trends, aproximadamente 351 mil pessoas foram forçadas a se deslocarem do
país. O continente africano registrou cerca de 08 conflitos desencadeados a partir do ano de
2010. Com o término da Guerra Fria, os interesses políticos recaíram sobre o Continente
Africano, logo, alguns países da África passaram a sofrer com a instabilidade econômica e
política17.

13

Relatório do ACNUR revela 60 milhões de deslocados no mundo por causa de guerras e conflitos. Disponível
em:
http://www.acnur.org/portugues/2015/06/18/relatorio-do-acnur-revela-60-milhoes-de-deslocados-nomundo-por-causa-de-guerras-e-conflitos/. Acesso em 11 de setembro de 2018.
14

Conflitos na África estão gerando deslocamentos massivos, adverte ACNUR. Disponível em:
http://www.acnur.org/portugues/noticias/noticia/conflitos-na-africa-estao-gerando-deslocamentos-massivosadverte-acnur/. Acesso em 20 de jan. de 2018.
15

Conflito na Costa do Marfim já fez mais de 100 mil refugiados. Disponível
http://g1.globo.com/mundo/noticia/2011/03/conflito-na-costa-do-marfim-ja-fez-mais-de-100-milrefugiados.html. Acesso em 19 de maio de 2018.
16

em:

Entenda a guerra na Líbia. Protestos contra regime viraram guerra civil, e tropas ocidentais agiram.
Muammar Kadhafi, que está no governo desde 1969, diz que só sai morto. Disponível em:
http://g1.globo.com/revolta-arabe/noticia/2011/02/entenda-crise-na-libia.html. Acesso em 19 de maio de 2018.
17
Diante do crescimento das guerras, a ONU cada vez mais estava sendo cobrada por uma ação que manifestasse
o desejo da comunidade internacional na busca pela resolução dos conflitos. Logo, a atribuição concedida a ONU
em sua criação no ano de 1945, tornou sua função ainda mais evidente no que tange a resolução de tais conflitos
(PENNA FILHO, 2004). Assim o conflito passa a ser observado como um “regulador” social, pois ele produz
força de coesão capaz de manter a sociedade unida, atrelando ao conflito característica de um agente construtor

25

No ano de 2013 a Ucrânia enfrentou uma crise social e econômica, tal conflito
originou-se na desistência do presidente Viktor Yanukavich em selar um acordo econômico e
político com a União Europeia (EU), optando em firmar relações comerciais com a Rússia.
Em decorrência dessa decisão a população saiu às ruas em protesto contra o governo do
presidente, questionando a escolha do mesmo. Em fevereiro de 201418 as manifestações
resultaram em um conflito violento, resultando na morte de ucranianos. Em 2015 a Ucrânia
atingiu o número de 1,1 milhão de deslocados, enquanto os pedidos de solicitação de asilo
foram de 674.300 em países vizinhos, enquanto na Rússia esse número atingiu 542,8 mil
solicitações. Cerca de 11 mil pessoas, entre elas 2.240 crianças e aproximadamente 350
pessoas com deficiência física foram deslocadas pelas autoridades ucranianas, em virtude do
conflito vigente daquele ano, conforme notícia divulgada no site do United Nations (UN)19.
O fluxo de refugiados muda sua composição com o passar do tempo, mesmo que sua
raiz de formação esteja estruturada numa dimensão macrossocial, as relações econômicas,
política, religiosa tornam-se a raiz motriz para a causa do deslocamento dessas pessoas.
Norbert Elias observou que a palavra sociedade é transmitida de geração a geração, e não há
empecilhos quanto a sua compreensão, todavia, ele demonstra que apesar da sociedade ser
composta por indivíduos, sua estrutura não será a mesma quando comparamos com outras
sociedades encontradas na Ásia, Oriente Médio ou América, pois a sociedade formada por
indivíduos não se assemelhará as demais (ELIAS, 1994). É imprescindível observar as
formações distintas, e o crescimento do fluxo de refugiados, analisar como ele se configura,
pois não se trata de um fenômeno já planejado, mas sujeitado e remodelado às circunstancias
originadas de um fator macro, o qual implicará na nova configuração de deslocados.
Através da transição de uma dada organização social, novos padrões passam a ser
percebidos no que tange a rede de relacionamentos humanos, tornando-se perceptível por meio

no que tange as relações sociais. Diante dessa assertiva, destaca-se o papel fundamental do conflito que resultou
na Primeira Guerra Mundial. A insegurança, e o sentimento de perigo constante tornaram-se elementos cruciais
no desenvolvimento de mecanismos que garantissem a paz e segurança internacional. Desse modo, é possível
observarmos que umas das características do conflito é solucionar o dualismo divergente, sendo ele utilizado
como mecanismo de obtenção de uma unidade social. Mesmo que suas estratégias estejam atreladas a aniquilação
de uma das partes envolvidas. Conforme Simmel (1983) o conflito é uma sociação, levando em consideração
que as interações dos indivíduos e suas dissociações como ódio, necessidade e desejo são nada menos que a
causa do conflito.
18
Entenda a crise na Ucrânia: País assinou acordo com a UE após protestos e destituição de presidente.
Movimento levou à tomada da Crimeia pela Rússia e mais separatismos. Disponível em:
http://g1.globo.com/mundo/noticia/2013/12/entenda-os-protestos-na-ucrania.html. Acesso em 20 de Jan. de 2018.
Ukraine: UN aid agency concerned by ‘dire’ conditions facing civilians in conflict areas. Disponível em:
http://www.un.org/apps/news/story.asp?NewsID=50287#.WmNu9bDR8fe. Acesso em 20 de jan. de 2018.
19

26

dos códigos de conduta. A incorporação de tais códigos passam a ser inseridos a estrutura
social, ocorrendo de forma direta a associação entre os indivíduos por meio dos sentimentos
e comportamentos, os quais passam a ser regulados. Sendo o medo, e o sentimento de não
pertencimento um mecanismo que acentua a disparidade existente esse os dois grupos sociais;
nativos e recém-chegado.
A condição da pessoa refugiada torna-se reflexo das consequências referentes às
ações e omissões políticas, a vítima de deslocamento forçado carrega uma noção de
transitoriedade, ela passa a ficar à margem do sistema estatal, o qual reafirmará sua soberania
nas ações de proteger, incluir e excluir o refugiado. O refugiado, de acordo com (SOUZA,
2016) tornou-se uma nova representação das minorias, torna-los culpados ou acusa-los da
escassez de recursos, ou que eles são a causa da distorção e corrupção do sistema não os fazem
estar apenas inseridos na crise de refugiados. Mas isso acentua, e reconfigura o olhar de que
eles são a raiz da crise.
Tal afirmação é observada na execução das ações das estruturas políticas, como da
postura da própria sociedade civil. As informações fragmentadas passadas para os que vem
de longe a respeito de como será sua vida na nova terra, os distancia ainda mais de serem
inseridos socialmente. Uma jovem venezuelana, relatou20 que ao chegar ao Brasil, não lhe
fora informado como seria sua situação após ultrapassar a fronteira. A jovem informa que não
sabia quais eram os procedimentos necessários para sua regularização no país ou a quem
recorrer para buscar ajuda, ela contou com apoio de uma família de brasileiros que a ajudaram
a retirar toda documentação necessária, como também entrar com o pedido de refúgio. O
desafio do acolhimento dos refugiados ocorre com base nas relações construídas entre o
outsider e o nativo, com isso, observa-se que a hospitalidade se encontra no grupo pertencente
a comunidade receptora, e são os nativos que decidem conceder ou não a efetivação da
recepção dessas pessoas. Sendo essa ação, reflexo simbólico do poder, tendo em vista que são
os grupos receptores que irão consentir ou não de forma cordial na inserção do refugiado na
sociedade.
A construção do que vem a ser um refugiado está intrínseco nos dispositivos legais
elaborados pelo ACNUR, onde garante a definição jurídica e política dessas pessoas de acordo
com o evento pós Segunda Guerra Mundial (MOREIRA, J.B, 2014). O processo de

20

No dia 19 de julho de 2018 estive em Boa Vista trabalhando em como voluntária em apoio aos refugiados,
durante o período que estive em Roraima conheci alguns jovens venezuelanos que compartilharam sua trajetória
como refugiada venezuelana em solo brasileiro.

27

reconhecimento do status de refugiado dividiu-se em duas etapas, a primeira trata sobre o
conhecimento a respeito da situação que contextualiza o deslocamento. A segunda etapa trata
sobre a aplicabilidade dos parâmetros definidos na convenção de 1951, a qual irá separar
algumas classificações que facilitem a identificação da pessoa refugiada, possibilitando o
reconhecimento de forma ágil.
Em 2016, durante meu trabalho como voluntária em um campo de refugiados na Ilha
de Lesvos na Grécia, que naquele ano havia se tornado “porta de entrada” para muitos
deslocados oriundos do Oriente Médio, África e Ásia, pude notar que muitos que ali chegavam
já se reconheciam como refugiado e sabiam a quem recorrer na busca da concessão do refúgio.
Essa comunicação que existia entre refugiados residentes do campo de assentamento, em
conjunto com os refugiados recém-chegados, facilitava o compartilhamento das informações
sobre como proceder no novo local de residência. Em contraponto a isso, no período que estive
em Roraima observei que muitos venezuelanos diferentemente dos refugiados que se
encontram na Europa, desconhecem quais são as formas legais para se estabelecer no território
brasileiro, uma das problemáticas identificadas refere-se ao próprio reconhecimento como
refugiado. Há um nítido desconhecimento das regras e muitos não entendem sequer a
definição da terminologia, tampouco lhes é explicado sobre seus direitos e deveres na nova
terra.
O acesso à informação desses refugiados venezuelanos acontece de forma
fragmentada ao cruzarem a fronteira com o Brasil. Os quais, sofrem um abandono
institucional, tendo em vista a problemática em sua inserção à comunidade receptora e o
acesso a informações que esclarecem a respeito da atual situação do indivíduo. Logo, pode-se
afirmar que a fragmentação encontrado na estrutura da sociedade numa esfera macro, irá
influenciar na ruptura no que concerne a autoidentificação do refugiado.
Alguns conceitos sobre o que vem a ser um refugiado nos são apresentados por meio
do documento de Terminologia do Direito dos Refugiados21, nele é possível ter uma
compreensão maior sobre esse status e seu reconhecimento:
a) Refoulement indirecto; se trata da pessoa que não pode ser enviado a um
país que ameaça sua liberdade e segurança.

21

"Terminology Related to Refugee Law" (Genebra, Janeiro de 1995).
http://www.cidadevirtual.pt/acnur/acn_lisboa/indger.html. Acesso em 23 de maio de 2018

Disponível

em:

28

b) Refugiados de Guerra; se trata do requerente que apresenta seu temor por
sua própria seguridade com base na ameaça a sua liberdade religiosa, ou
fundamentada por um posicionamento político.
c) Refugiados em órbita; trata-se daqueles que não conseguiram asilo em
nenhum país.
1.3

A questão dos refugiados no Brasil
A questão dos refugiados em território nacional não é algo novo, seu

desenvolvimento e origem são observados ainda no pós Segunda Guerra Mundial. Segundo
Haydu (2010) o envolvimento do Brasil no que tange as relações no envolvimento com as
questões envolto aos refugiados teve seu início ainda em sua relação com o Bloco Ocidental,
no qual o país passou a acompanhar e participar no desenvolvimento e no estabelecimento de
políticas externas no que se refere ao reassentamento de refugiados e vítimas e da guerra
oriundas da Europa.
O envolvimento do país quanto a esse fenômeno possibilitou lograr de um lugar de
prestígio no Conselho Geral da OIR. Contudo, apesar das expectativas envolto na efetivação
brasileira no comitê executivo do órgão, o país não se tornou Estado-membro da OIR. De
acordo com Andrade (2005), o não ingresso do Brasil na organização está pautado em duas
características, a primeira refere-se a ordem estrutural, por considerar falhas burocráticas e a
inexistência de um cadastro na contratação de mão de obra qualificada, sendo um dos critérios
imprescindíveis na seleção de refugiados e deslocados, como também a ausência de reembolso
das autoridades Federais, resultou no término das atividades brasileiras na Organização
Internacional para Refugiados.
A segunda problemática observada por Andrade (2005) no que diz respeito o
envolvimento precoce do país na OIR está fundamentada numa deficiência de ordem
conjuntural, ou seja, devido as propagandas relacionadas as atividades do órgão fez com que
a resistência pública fosse fortalecida em oposição as atividades desenvolvidas pela OIR,
enxergando-o dessa forma como uma ameaça a Constituição brasileira.
Com a atuação temporária da OIR frente a uma problemática que só crescia, é a partir
do ano de 1930, que uma política de imigração é iniciada no Brasil de caráter restrito, onde o
objetivo era impedir que o estrangeiro se tornasse uma ameaça ao trabalhador. A justificativa
para restrição estava pautada em proteger o trabalhador nacional; logo, o imigrante era
considerado um indesejado para a sociedade. De forma gradual, foi introduzido um regime de
cotas que limitava o número de estrangeiros que poderiam adentrar no país. Conforme Melo
(2015), o envolvimento do Brasil, ainda que de forma não permanente no Conselho da Liga

29

estava relacionado com a ambição de estar lado a lado com as grandes potências, procurando
intensificar o prestigio do país num cenário internacional.
Diante da atuação das grandes potências nos assuntos relacionados a este fenômeno
social, BRITO (2013) ressalta como a dimensão deste fluxo expõe a repressão do Estado sobre
esses indivíduos, como também a expansão da importância desses atores sociais numa
perspectiva política e social. Um exemplo disso é a presença desse tema nos escritos de
Engels, Marx e Simmel, que nos permitem uma compreensão no que tange as consequências
sociais, econômicas e culturais de países “imigrantistas” (OLIVEIRA, 2013:74). O que passa
a ser analisado, ainda de forma sutil são as formas de socialização entre os recém-chegados e
os estabelecidos, onde o fenômeno social é dotado de um caráter variável, o indivíduo tornase a peça central, não apenas o grupo o qual ele pertence. Na sociologia da imigração o
interesse é apreender a especificidade do grupo outsider em cada país que eles adentram,
considerando que “o deslocamento rompe tradições, marca a modernidade” (OLIVEIRA,
2013:85).
O recém-chegado era um produto que estava em formação, sendo ele resultado
relacionado à estratificação social, e embora ele não tenha sido diretamente o objeto de análise
sociológica da época, sua presença é perceptível quando se é discutido a respeito da coesão
social, mudanças socioeconômicas, provenientes das mobilidades geográfica influenciando
também o desenvolvimento do capitalismo. Na Revolução Industrial, Engels observou o
impacto causado pelos grupos migratórios no mercado de trabalho, sendo eles denominados
como maltrapilhos, os quais viviam em bairros desfavorecidos de Londres. Durante a análise,
Engels buscou compreender as causas que levaram milhares de irlandeses a migrarem, foi
observado que a característica principal era a busca por trabalho. É necessário a compreensão
do que os motiva ingressar em um ambiente empregatício com uma remuneração mais baixa
que o habitual. O empregador estabelecerá algumas diretrizes de funcionamento que favoreça
o próprio meio de obtenção de renda, ou seja, se busca uma força de trabalho de aspecto
flexível e de um valor baixo, o estrangeiro, por estar em terra estranha aceitará tudo aquilo
que lhes for proposto. Se dispondo a realizar tarefas extras, para garantir sua permanência no
emprego (SUZUKI, 2012).
Marx (2012, p.36) possui uma análise seguindo a mesma perspectiva, porém a peça
central de sua análise discorre a respeito do acúmulo de capital, ele correlaciona o incremento
de riqueza ao processo migratório, sendo ambos os produtos decorrentes da exploração do
trabalho. De acordo com Oliveira (2013), Durkheim contribuiu de forma indireta com análises

30

pertinentes ao fenômeno da migração, sua observação pode ser percebida nos estudos
relacionados à integração e socialização, a qual se dava por meio da educação e da divisão do
trabalho. Já em uma perspectiva weberiana a preocupação estava fundamentada nas
consequências dos processos de mobilidade espacial. Weber se deteve em explicar e analisar
o impacto da “Europa Periférica” nos espaços de colonização inglesa demonstrando como os
migrantes que residiam no leste europeu eram considerados “incivilizados” pelos ocidentais.
Nessa perspectiva o indivíduo vítima da mobilidade forçada é visto como uma ameaça
iminente ao desenvolvimento socioeconômico do país. Assim, mostra-se necessário não só no
território nacional, mas em toda comunidade internacional a elaboração de mecanismos que
pudessem atender as necessidades específicas de cada grupo formado pelo deslocamento
forçado.
É a partir do final da II Guerra Mundial que o governo brasileiro passa a analisar a
vinda de refugiados em um modelo que não fosse restrito como o da Constituição de 1934,
permitindo a entrada de refugiados de guerras e famílias inteiras. É a partir de 1945 que o
migrante ganha visibilidade na política nacional, onde passa a se pensar sobre políticas
voltadas para essas pessoas. Durante o período da Ditadura Militar, ocorreu o êxodo de muitos
brasileiros, os quais deixaram o país em virtude dos conflitos sociais, almejando refúgio em
outro país. A essas pessoas era concedido o visto de turistas, permitindo-lhes a estadia
provisória em outra nação. Essa estadia provisória foi resultado de um acordo entre o governo
brasileiro e o ACNUR. O Brasil foi um dos países pioneiro da América do Sul que
regulamentou mecanismos que visavam a proteção dos refugiados, em um contexto nacional
o país também recebeu destaque ao elaborar uma lei voltada para essas pessoas, Lei nº
9.474/97.
Durante as décadas de 1970 e 1980, foi registrado o número de refugiados oriundos
da América Latina, contudo, a essas pessoas foram concedidas a estadia provisória e lhes foi
entregue o visto de turista. Durante sua permanência provisória no Brasil que duraria cerca de
trinta dias, essas pessoas aguardavam serem reassentadas para outro país. O ACNUR no ano
de 1977 instala seu escritório em solo brasileiro na cidade do Rio de Janeiro, isso ocorreu
tendo em vista à instabilidade política que a América Latina enfrentava naquele momento. Em
virtude dos conflitos oriundos de regimes ditatoriais, refugiados latino-americanos adentraram
em solo brasileiro em busca de refúgio. Contudo, o Brasil rejeitava essas pessoas, pois tinham
ideologia que se assemelhava às daqueles indivíduos que o governo brasileiro perseguia
(HAYDU, M. 2010).

31

É importante salientar que o Brasil durante esse período estava vivendo um regime
de exceção durante a Ditadura Militar, onde os direitos civis estavam restritos a uma ação
autoritarista vigente naquela época. Assim, a atuação do ACNUR era executada de forma
restrita. Logo, o escritório do organismo era procurado com exclusividade por pessoas
oriundas da Argentina, Uruguai e Paraguai, sendo elas reassentadas em países da Europa
(HAYDU, M. 2010). O ACNUR pôde contar com o envolvimento de outros órgãos que
estavam comprometidos em atividades que visavam medidas protetoras para os refugiados
destes países, dentre esses órgãos destacam-se Cáritas Arquidiocesana do Rio de Janeiro e São
Paulo, Comissão Justiça e Paz, fundada pelo Arcebispo Dom Paulo Evaristo Arns no ano de
1972. Os trabalhos aconteciam em conjunto com a Igreja Católica, objetivando oferecer ajuda
humanitária aos refugiados, com base nos temas de Direitos Humanos, concedendo assistência
social àqueles que estavam em busca de refúgio ou asilo. A Comissão possuía vínculo com a
Arquidiocese de São Paulo e exercia suas atividades em meio à repressão militar daquela
época.
Diante das restrições enfrentadas, o Brasil tornou-se o primeiro país da América do
Sul a normatizar medidas de proteção aos refugiados. Conquanto, entre as décadas de 1970 e
1980, o governo brasileiro susteve o mecanismo de reconhecimento do indivíduo como
refugiado, apenas para pessoas oriundas da Europa. No ano de 1979, o Brasil deixou de
reconhecer cerca de 150 vietnamitas como refugiados devido à cláusula que tratava sobre a
limitação geográfica, a qual não concedia o status de refugiado ao solicitante, de acordo com
a reserva geográfica, tendo em vista que só eram consideradas refugiadas pessoas oriundas do
continente europeu. Contudo, era concedido um status migratório alternativo (ALMEIDA, G.
A, 2000, p.375). Porém, é com a intervenção do ACNUR que essas pessoas puderam ser
acolhidas em solo brasileiro mediante a condição de migrantes.
É de suma importância diferenciarmos aqui os termos “refugiado” e “migrante”22,
ainda que torne-se comum a utilização de ambos como sinônimo, porém há uma grande
distinção entre eles. A terminologia “refugiado” trata especificamente sobre aqueles cuja
definição e proteção foram estabelecidos no direito internacional. Logo, refugiado é todo
aquele que se encontra fora do seu país de origem, sendo esse deslocamento tendo como
fundamento temores de perseguição, conflitos, violação da dignidade humana. A

22

Refugiados
e
Migrantes:
Perguntas
frequentes.
Disponível
em:
http://www.acnur.org/portugues/2016/03/22/refugiados-e-migrantes-perguntas-frequentes/. Acesso em 29 de
maio de 2018.

32
generalização da terminologia “migrante” pode trazer consequências para a segurança do
refugiado. É importante se fazer entender que migração diz respeito ao deslocamento
voluntário, ou seja, refere-se aquela pessoa que cruzou a fronteira almejando estabilidade
econômica. Todavia, há aqueles indivíduos vítimas de catástrofes naturais que são
considerados migrantes. Destarte, utilizar um único termo para abordar dois grupos de
deslocados distintos pode desaguar no enfraquecimento ao apoio de todo aquele que solicita
o reconhecimento de refugiado.
Em 1982, a presença do ACNUR em solo brasileiro é oficialmente reconhecida pelo
governo e com isso inicia-se uma nova forma na relação de proteção aos refugiados. Como
resultado desse reconhecimento, em 1986, cerca de 50 famílias iranianas foram acolhidas no
país, um total de 130 pessoas recebendo a condição de refugiado. Um grande marco no
envolvimento do Brasil com a temática dos refugiados refere-se à aprovação da nova
Constituição da República Federativa do Brasil, em 1988, a qual refletiu a ruptura do
regimento ditatorial. Em 1989, a limitação geográfica é eliminada, possibilitando a criação de
novos dispositivos para que refugiados de qualquer país pudessem receber o reconhecimento
como tais no Brasil. No ano de 1992-1994 o Brasil acolheu cerca de 1,2 mil angolanos, a eles
foi concedido o status de refugiados, mesmo não se adequando ao que caracterizava refugiado,
o qual refere-se às pessoas vítimas de perseguição ou repressão religiosa, política e racial.
A construção do Estatuto Jurídico do Refugiado torna-se um marco, considerando
que se trata da primeira lei no Brasil que define o conceito de refugiado, tendo sua aprovação
na Câmara dos Deputados e no Senado, sendo promulgado em julho de 1997 pelo presidente
da República. Destarte, o Brasil torna-se o primeiro país na região latino-americana a projetar
uma legislação para refugiados. Sendo considerada uma lei inovadora precursora do órgão
responsável em analisar as solicitações de refúgio, o Comitê Nacional para refugiados
(CONARE23). De acordo com os dados divulgados pelo CONARE, em 2016 houve um
aumento de 12% de refugiados que foram reconhecidos no país. Logo, conforme esses dados,
cerca de 9.552 refugiados de mais de 82 nacionalidades, foram reconhecidos. Sendo 8.522
pessoas reconhecidas por mecanismos tradicionais de elegibilidade, o qual trata dos meios
legais outorgado no Inciso I da Lei de 9.474, onde o indivíduo é reconhecido como refugiado
por motivos de perseguição religiosa, racial, grupo social ou político, motivos esses que de
acordo com a legislação a vítima de deslocamento forçado passará a ser reconhecida como

23

CONARE: Comitê Nacional para os Refugiados é responsável por receber as solicitações de refúgio,
determinando as exigências necessárias para o reconhecimento do refugiado.

33
refugiado, conforme a Lei nº 9.474/1977 em seu Art.33 que diz que “o reconhecimento da
condição do refugiado obstará o seguimento de qualquer pedido de extradição baseado nos
fatos que fundamentaram a concessão de refúgio.”.
A concessão de refúgio no Brasil conta com o envolvimento do ACNUR, CONARE,
Cáritas Arquidiocesana e o Departamento de Polícia Federal. O pedido de asilo deve ser feito
pelo indivíduo na Polícia Federal, onde o solicitante irá expor as razões que o levaram a deixar
seu país de origem, após essa primeira etapa o solicitante de refúgio é encaminhado para a
sede do Cáritas, a fim de que o mesmo passe por uma entrevista minuciosa, em seguida é
encaminhado para o CONARE, o qual por meio de informações concedidas pelo ACNUR
emitirá um documento de identidade provisório até o parecer elaborado pelo CONARE e OAB
indicar a aceitação ou não do solicitante. A categorização de como o sujeito pode se identificar
como refugiado, acentua a separação que há entre os nativos e recém-chegado. Os parâmetros
descritos no Art. 1º Lei 9.474 de 22 de julho de 19997 a respeito da característica que define
o indivíduo como refugiado, coloca aquele que vem de longe numa posição de não
pertencimento. De acordo com Bauman (2001, p.126) a fluidez dos laços sociais estimulam
os esforços dos cidadãos em manter distância do “outro”. Tal decisão intensifica o objetivo
em identificar aquele que se tornou uma ameaça para o corpo social, ampliando o desejo de
expelir o estranho do meio comum. Os mecanismos de “purificação” social podem ser
apontados através de instrumentos jurídicos, que objetivam limitar e controlar as atividades
mais básicas daquele que passa a ser visto como uma patologia social. Por meio de uma
política de controle, retira-se a autonomia do indivíduo, tornando-os dependentes de órgãos
que os direcionarão para a nova realidade, conforme a Lei 9.474 de 22 de julho de 19997 que
dispõe das seguintes determinações:
Art. 26. A decisão pelo reconhecimento da condição de refugiado
será considerada ato declaratório e deverá estar devidamente
fundamentada.
Art. 27. Proferida a decisão, o CONARE notificará o solicitante
e o Departamento de Polícia Federal, para as medidas
administrativas cabíveis.
Art. 28. No caso de decisão positiva, o refugiado será registrado
junto ao Departamento de Polícia Federal, devendo assinar termo
de responsabilidade e solicitar cédula de identidade pertinente.

As principais causas que motivaram os deslocamentos de pessoas se constituem por
violações dos direitos humanos, perseguição religiosa, regimes antidemocráticos e conflitos
armados. Quando o indivíduo se afasta do seu local de origem, adentrando em outra terra,
surgem três situações que caracterizam essa mudança: a primeira refere-se ao refúgio, quando

34

o indivíduo é acolhido pelo país que ele ingressou, a segunda situação remete a repatriação, e
a terceira situação diz respeito ao envio do refugiado a um terceiro país. Essas situações se
denotam como soluções que visam elucidar a problemática da atual crise existente, essas
soluções estão consolidadas com objetivo de repatriação voluntária dessas pessoas, integração
local e o reassentamento do refugiado.
Há um pequeno número de países que participam do programa de reassentamento do
ACNUR. Por outro lado, houve um aumento na participação dos países oriundos da América
Latina, incluindo o Brasil, Argentina, Paraguai, Chile e Uruguai. Os países que adotam o
programa de reassentamento proporcionam ao refugiado proteção física e jurídica, além de
permitir que eles tenham acesso aos programas sociais e cultural do país. O qual se dá através
do seguinte requisito:
Art.45 O reassentamento de refugiados no Brasil se efetuará de
forma planificada e com a participação coordenada dos órgãos
estatais e, quando possível, de organizações não governamentais,
identificado áreas de cooperação e de determinação de
responsabilidades.

De acordo com ACNUR24 “os países com maior número de refugiados reconhecidos
no Brasil em 2016 foram Síria (326), República Democrática do Congo (189), Paquistão (98),
Palestina (57) e Angola (26)”. Em 2016, o Brasil teve um aumento significativo de solicitação
de refúgio para venezuelanos, se comparado ao ano de 2015. O aumento em 2016 foi
expressivo: 307%. Cerca de 3.375 venezuelanos encaminharam solicitações de refúgio no
Brasil, enquanto que em 2015 esse número era de apenas 829 pedidos.
Gráfico 3 - Solicitação de Refúgio - Venezuelanos (2010-2016)

24

Dados sobre Refúgio no Brasil. Disponível em: http://www.acnur.org/portugues/recursos/estatisticas/dadossobre-refugio-no-brasil/. Acesso em 27 de jan. 2018.

35

4
4
4
8
1
9
55
64

2010
2011
2012
2013

209
272

2014

829

2015

1.101
3.375

2016

4.434
0

500

1.000

1.500

2.000

2.500

Entrada de Refugiados no País

3.000

3.500

4.000

4.500

5.000

Solicitações Pendentes

Fonte: Departamento de Polícia Federal. Elaboração da autora

Um dos fundamentos de solução adotada pelo ACNUR para essa crise migratória
refere-se a repatriação, a qual tem maior incentivo do Alto Comissariado das Nações Unidas,
considerando que apesar da atual condição dessas pessoas, o que eles mais almejam é um dia
retornar ao país de origem, tendo em vista que é em seu país onde eles encontram toda a
identidade e expressão cultural. A ambivalência quanto à autoidentificação é uma ação
arrolada no contexto de mobilidade que essas pessoas estão vivendo. Esses indivíduos
permanecem conectados as normas de sua cultura de origem. Contudo, de forma inconsciente
eles perpassam um processo de transculturação, que são sentidos e percebidos por meio das
atividades do cotidiano, sob a influência da cultura do país que os recebe (BRITO, 2010).
Em contrapartida, esse retorno torna-se conflituoso, pois ainda há razões que colocam
em risco a sobrevivência desses indivíduos. A integração local permite que o refugiado possa
encontrar um lar e se tornar parte da comunidade a qual ele estará sendo inserido, podendo
contar com oportunidades para recomeçar a sua vida. Apesar dos esforços em integrar a pessoa
refugiada, surge uma problemática, que se refere à adaptação do indivíduo a nova realidade
social, podendo ser manifestado por meio dos hábitos ou expressões culturais. Dentro dessa
nova realidade a classe que domina irá assegurar uma comunicação entre sua própria classe e
os recém-chegados, diferenciando-os um dos outros. Logo, a comunicação torna-se um meio
de interação de poder, o qual irá construir e estabelecer a ordem da realidade que o refugiado
se encontra. O mesmo mecanismo de poder simbólico utilizado pelos estabelecidos como

36

forma de integração social é o mesmo que realça a presença e a diferença entre os dominados
e dominantes.
A disparidade na relação do refugiado e sociedade acolhedora acentua a interação de
conflito entre esses dois grupos. Se por um lado há o interesse da vítima de deslocamento
forçado em ser inserido no novo contexto social, seja ao acesso à educação ou mercado de
trabalho, os indivíduos da comunidade acolhedora reforçarão que a inclusão do outsider não
deve acontecer de forma completa. As regras do jogo social delimitam a ação dentro do
campo, vale ressaltar que as regras que regulam as ações desses indivíduos nem sempre
estarão explícitas, elas podem ocorrer de forma tácita. Assim, os agentes possuidores do poder
passam a ocupar posições dominantes do espaço social como uma estratégia para preservar a
relação de poder vigente. Esse espaço se configura como um campo de forças, um espaço
dinâmico onde ocorrem interações entre os indivíduos, um campo de luta e conflito (Bourdieu,
1989). A dinâmica do campo obedece uma ordem, à qual é movimentada através das disputas
entre os agentes sociais. É nesse espaço que é validado leis e símbolos que determinam leis
próprias. Ao mesmo tempo que o campo possui uma autonomia, ele também é subordinado
as leis sociais.
Em cada campo há diferentes conjuntos de interesses que regulam o seu
funcionamento, dotados de capital econômico, cultural, social e o simbólico. Cada um desses
corresponderá a um conjunto de práticas e habilidades. Tendo em vista que o poder desses
campos estrutura o comportamento do indivíduo, é importante salientar que o habitus é um
agente que organiza as práticas e molda a identidade de seus sujeitos. De acordo com Bourdieu
(1996) esse reflexo nas transformações podem ser sentidas quando as pessoas passam a
apropriar-se dos mecanismos de sociabilidade que o país de recepção lhes oferece, como por
exemplo, o ingresso a uma instituição de ensino ou de trabalho. O habitus dispõe-se na
identificação da relação indivíduo e sociedade, trabalhando como um mediador entre a esfera
micro e macro, o qual é constituído mediante dispositivos estruturados e estruturantes, sendo
eles conduzidos por meio de funções e ações do cotidiano. As disposições adquiridas ao longo
do processo de integração a nova sociedade receptora expõe reflexões que não se limitam
apenas a um espaço imaginário simbólico.

37

CAPÍTULO 2: O PROCESSO DE CONCESSÃO DE ASILO NO BRASIL

2.1

Convenção de 1951- Um olhar sobre o Estatuto dos Refugiados
No mesmo ano que se originou a fundação do ACNUR, em 28 de julho de 1951, por

meio de uma conferência de Plenipotenciários das Nações Unidas em Genebra, foi redigida
uma convenção que tinha como propósito regularizar o status de refugiado. Assim, em 22 de
abril de 1954 entra em vigor a Convenção das Nações Unidas sobre o Estatuto dos Refugiados.
A convenção ficou conhecida como Convenção de 1951.
A Convenção é considerada um marco jurídico. É ressaltada no documento
internacional a importância de todo ser humano ser contemplado com os direitos humanos,
manifestando dessa forma a preocupação com bem estar social e a seguridade jurídica para as
vítimas de deslocamentos forçados. Diante de todos os fenômenos sociais registrados ao longo
da história da humanidade e que contribuíram para o crescimento expressivo de refugiados
pelo mundo, manifestou-se no plenipotenciário das Nações Unidades uma necessidade em
reavaliar os acordos internacionais pertinentes aos refugiados, onde sua aplicabilidade fosse
oferecida a todas as vítimas por meio de um novo acordo internacional.
Destarte, ficou sobre o encargo do Alto Comissariado das Nações Unidas averiguar
o cumprimento das determinações e disposições descritas no documento. Em seu primeiro
momento, a Convenção trabalhava com base em um espaço limitado, onde a aplicabilidade de
medidas protetoras para os refugiados era restringida para uma reserva temporal (conhecida
também como reserva geográfica), tendo em vista que as pessoas reconhecidas como
refugiados até então, eram os indivíduos oriundos do continente europeu.
A funcionalidade Convenção de 1951 se aplicava de forma limitada as necessidades
dessas vítimas, conforme seu artigo:

Artigo 1º §2º Que, em consequência dos acontecimentos
ocorridos antes de 1º de janeiro de 1951 e temendo ser
perseguida por motivos de raça, religião, nacionalidade, grupo
social ou opiniões políticas, se encontra fora do país de sua
nacionalidade e que não pode ou, em virtude desse temor,
não quer valer-se da proteção desse país, ou que, se não tem
nacionalidade e se encontra fora do país no qual tinha sua
residência habitual em consequência de tais acontecimentos,
não pode ou, devido ao referido temor, não quer voltar a ele.
(Convenção de 1951, pág.02)

38

A Convenção de 1951 estabeleceu mecanismos legais que definem parâmetros que
tratam sobre o método que o refugiado deve ser tratado, abrangendo as necessidades que
deveriam ser atendidas, tais como; educação, assistência jurídica, questões empregatícias.
Contudo, não é de sua competência impor medidas que limitem a ação do Estado em
desenvolver um tratamento a essas pessoas. Assim, a Convenção tem como função ser
aplicada sem discriminação, seja ela por cor, sexo, religião ou etnia. Ela também trata do
princípio da não devolução, o qual determina que nenhum país deverá devolver ou expulsar o
refugiado contra a sua própria vontade. Vale ressaltar que a Convenção só era aplicada aos
acontecimentos que ocorreram antes da data de 1º de janeiro de 1951. Logo, sua aplicabilidade
não era efetuada de maneira que abrangesse a todos, com isso, a necessidade de uma
providência sobre a proteção dos novos fluxos de refugiados que estavam se formando.
Devido a essa limitação houve a necessidade de trabalhar dispositivos que pudessem abranger
todas as vítimas de deslocamentos forçados.
Apesar de o documento ter sido um marco relevante no que tange ao caráter político
e humanitário, a convenção possuía uma limitação temporal em seus registros, como também
sua definição do que vem a ser uma pessoa refugiada, a definição era bem mais restrita e
estava relacionado a essas vítimas de deslocamentos forçados. Apenas pessoas que
conseguiam sair de seu país de origem recebia o status de refugiados, por outro lado, aqueles
que não conseguiram apoio do seu próprio país, ou que porventura não lograssem ultrapassar
a fronteira não receberia o status. De acordo com BARTELEGA (2007) nem todo aquele que
consegue fugir do local de origem, devido à grande violação de seus direitos humanos
conseguia o reconhecimento de refugiado. Apenas os deslocados, cuja motivação estava
fundamentada por perseguição religiosa, política ou razões pertinentes a raça e grupo social
estavam debaixo da proteção da convenção.
Com isso, novas compreensões a respeito dessas vítimas foram sendo desenvolvidas,
a preocupação agora seria a elaboração de um documento que não anulasse a existência da
Convenção, mas que em seu escopo pudesse abranger e definir características que facilitassem
a identificação de cada vítima de acordo com sua necessidade.

2.1.1 Sobre as Disposições Gerais da convenção de 1951
A Convenção irá definir o termo refugiado em seu Artigo 1º, apresentando como
refugiado aquele que está fora do país de origem devido ao temor de perseguição por motivo

39

de raça, religião, nacionalidade, grupo social, opinião política. Do artigo 1º refugiado é todo
aquele que:
2) Em consequência dos acontecimentos ocorridos antes de 1º
de janeiro de 1951 e temendo ser perseguida por motivos de
raça, religião, nacionalidade, grupo social ou opiniões políticas,
se encontra fora do país de sua nacionalidade e que não pode
ou, em virtude desse temor, não quer valer-se da proteção desse
país, ou que, se não tem nacionalidade e se encontra fora do
país no qual tinha sua residência habitual em consequência de
tais acontecimentos, não pode ou, devido ao referido temor, não
quer voltar a ele.

Considerando a limitação da Convenção em garantir os direitos do refugiado apenas
para aquelas vítimas dos acontecimentos que antecediam a data da promulgação do
documento, foi desenvolvido uma das disposições mais importantes da Convenção, o
princípio do Non-Refoulement, que trata da não devolução do refugiado, Art. 33 - Proibição
de expulsão ou de rechaço:
1. Nenhum dos Estados Contratantes expulsará ou rechaçará, de
maneira alguma, um refugiado para as fronteiras dos territórios
em que a sua vida ou a sua liberdade seja ameaçada em virtude
da sua 9 Non-refoulement. 11 raça, da sua religião, da sua
nacionalidade, do grupo social a que pertence ou das suas
opiniões políticas.
2. O benefício da presente disposição não poderá, todavia, ser
invocado por um refugiado que por motivos sérios seja
considerado um perigo para a segurança do país no qual ele se
encontre ou que, tendo sido condenado definitivamente por crime
ou delito particularmente grave, constitui ameaça para a
comunidade do referido país.

O princípio da não devolução destaca o quão frágil e vulnerável a pessoa do refugiado
está diante do risco em retornar ao país que outrora vivera. É por meio deste princípio que se
pode notar a diferença entre o refúgio, o qual acontece de forma involuntária, e a migração
voluntária25, situação que se refere às pessoas que saem do país de origem em busca de
condições melhores de sobrevivência, almejando um emprego melhor e uma estabilidade
econômica. Assim como há uma preocupação referente à seguridade da pessoa refugiada, a
Convenção ressalta no documento a questão da preservação do bem estar interno do país que
recebe essas pessoas. Em seu Art. 33 tratará sobre a expulsão:

“Refugiados”
e “Migrantes”:
Perguntas
Frequentes.
Disponível
em:
http://www.acnur.org/portugues/noticias/noticia/refugiados-e-migrantes-perguntas-frequentes/. Acesso em 03
de fev. 2018.
25

40

1. Os Estados Contratantes não expulsarão um refugiado que se encontre
regularmente no seu território senão por motivos de segurança nacional
ou de ordem pública.
2. A expulsão desse refugiado somente ocorrerá em virtude de decisão
proferida conforme o processo previsto por lei. A não ser que a isso se
oponham razões imperiosas de segurança nacional, o refugiado deverá
ter permissão de fornecer provas que o justifiquem, de apresentar um
recurso e de se fazer representar para esse fim perante uma autoridade
competente ou perante uma ou várias pessoas especialmente designadas
pela autoridade competente.
3. Os Estados Contratantes concederão a tal refugiado um prazo razoável
para procurar obter admissão legal em outro país. Os Estados
Contratantes podem aplicar, durante esse prazo, a medida de ordem
interna que julgarem oportuna.

2.1.2 Protocolo de 1967
É com a demanda de novos fluxos de refugiados registrados a partir da década de
1960, os quais eram oriundos da Ásia e principalmente do Continente Africano, passou a ser
discutida a limitação da aplicação dos direitos para refugiados contidos na Convenção de
1951, tendo em vista que aplicabilidade dos direitos para esse novo contingente de
deslocamentos forçados não era possível, haja vista o que determina o artigo primeiro da
Convenção, o qual limita aplicação dos direitos a essas vítimas numa esfera geográfica e
temporal. Em 31 de janeiro de 1967 foi elaborado um protocolo relativo aos refugiados, com
objetivo de abranger o direito internacional a todas as vítimas de deslocamento forçado, não
apenas as pessoas que se tornaram refugiadas após a promulgação da Convenção de 1951.
Em 1966, após sua elaboração o Protocolo foi submetido a análises na Assembleia
Geral das Nações Unidas. Em 31 de janeiro de 1967 o Secretário Geral da Assembleia em
Nova York assinou o documento, o qual no dia 04 de outubro do mesmo ano entra em vigor.
Com a consolidação e ratificação do protocolo, os países foram direcionados a aplicar as
previsões estabelecidas da Convenção de 1951 para todos os refugiados, sem restringi-los. Os
direitos dos refugiados são reconhecidos internacionalmente por meio da Convenção de 1951
e do Protocolo de 1967, sendo esses dois documentos essenciais à proteção dos refugiados.

2.2 Declaração de Cartagena e o Refúgio no Brasil
Mesmo após a aprovação do instrumento específico que trata sobre o conceito de
refugiado, após a promulgação da Convenção de 1951, o ACNUR continuava auxiliando
algumas atividades na América latina, mas é a partir de 1970 que os trabalhos do Alto
Comissariado das Nações Unidas passam a ser reforçados na América Latina. No ano de 1984,
após uma reunião com representantes governamentais foi elaborado na cidade de Cartagena

41

na Colômbia, um documento cujo objetivo era ampliar os dispositivos descritos na Convenção
de 1951, assim, é assinado a Declaração de Cartagena cuja centralidade estava na efetivação
dos direitos humanos para essas vítimas. Ao ser promulgado o documento a orientação era
que além do cumprimento das normas descritas na Convenção, os Estados garantissem por
meio dos mecanismos jurídicos a inclusão do conceito refugiado de acordo com a
contextualização social do país, se estendendo não só aos aspectos referentes à cor,
naturalidade ou posicionamento político. Mas que o conceito validasse também as vítimas
cujos países se encontravam em uma violência generalizada e com ameaças aos direitos
humanos.
Após a elaboração de uma lei brasileira em 1977, que define o refugiado como
alguém que sofreu violação dos direitos humanos, o Estado brasileiro tem se dedicado em
seguir o que a Declaração de Cartagena trata sobre essas pessoas. De forma gradual a
Declaração tem sido incluída na Constituição brasileira desde o ato da sua promulgação em
1988 (ZERBINI; BARRETO, 2010). Dos direitos e deveres coletivos a Constituição brasileira
ressalta que:
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer
natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros
residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade,
à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
I - homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, nos
termos desta Constituição;
II - ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma
coisa senão em virtude de lei;
III - ninguém será submetido a tortura nem a tratamento
desumano ou degradante;
IV - é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o
anonimato;
V - é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo,
além da indenização por dano material, moral ou à imagem;
VI - é inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo
assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na
forma da lei, a proteção aos locais de culto e a suas liturgias;
VII - é assegurada, nos termos da lei, a prestação de assistência
religiosa nas entidades civis e militares de internação coletiva;
VIII - ninguém será privado de direitos por motivo de crença
religiosa ou de convicção filosófica ou política, salvo se as
invocar para eximir-se de obrigação legal a todos imposta e
recusar-se a cumprir prestação alternativa, fixada em lei;

O grande marco na Declaração de Cartagena refere-se à larga interpretação quanto
ao atendimento às necessidades dos refugiados, pois o objetivo é a proteção dessas pessoas,
sejam elas vítimas de circunstâncias de alto grau de violência e violação dos Direitos humanos,
como também abrangendo as pessoas de contextos pacíficos, ou seja, indivíduos que não

42

foram diretamente perseguidos ou que não se tornaram vítimas de conflitos armados, sendo
elas classificados, como imigrantes (MINCHOLA; REDIN, 2013. p.33). A contribuição
quanto a abrangência da definição do termo refugiado se aplica aquele que não se encaixa na
descrição clássica que consta na Convenção de 1951. Sua interpretação quanto ao termo
refugiado reflete o caráter inclusivo e flexível quanto a finalidade em proteger todos aqueles
que tiveram seus direitos humanos violados (WALDELY; VIRGENS; ALMEIDA, 2004. P.
127).
A Declaração de Cartagena preocupou-se também com a situação dos deslocados
internos, exigindo que a esse grupo fosse oferecido proteção como também assistência social
e jurídica. Uma característica que difere o referido documento em relação a Convenção diz
respeito a seu caráter de recomendação, tendo em vista que o documento não impõe a
comunidade internacional o cumprimento de suas disposições. O que distingue a Declaração
de Cartagena dos demais documentos que tem como objetivo a proteção dos recém-chegados,
está relacionado em seu objetivo de alcançar pessoas em seus atributos individuais, em
características que outrora não fora mencionado nos documentos anteriores, sem desmerecer
o que já foi outorgado anteriormente. O conceito do documento se dá por meio da necessidade
em atender os aspectos fundamentais da pessoa humana, visando a proteção a vida, garantindo
segurança e liberdade. O documento ainda prevê situações mais vulneráveis que requer uma
atenção redobrada. Em seu artigo 1º, inciso III, a Declaração de Cartagena determina que será
reconhecido todo aquele que sofrer violência generalizada:
III – devido à grave e generalizada violação de direitos
humanos, é obrigado a deixar seu pais de nacionalidade
e buscar refúgio em outro país.

Considerando que os conflitos tem sofrido uma mutação, o conceito descrito na
Declaração de Cartagena, é utilizado como estratégia para atender essa nova configuração de
violência generalizada, uma vez que a guerra não é o único fator que determina o auxílio
internacional a essas vítimas. De acordo com o documento, todo aquele que tiver seu direito
humano violado deve ser amparado pela comunidade internacional, não se restringindo à
temporariedade e espaço geográfico. Diferentemente do conceito da Convenção de 1951 que
olhava apenas para as vítimas numa ótica temporal e geográfica.
Dessa forma, a Declaração apresenta de forma objetiva e ampla sobre quem é o
refugiado:

43

Deste modo, a definição ou o conceito de refugiado recomendável
para sua utilização na região é o que, além de conter os elementos
da Convenção de 1951 e do Protocolo de 1967, considere também
como refugiados as pessoas que tenham fugido dos seus países
porque a sua vida, segurança ou liberdade tenham sido ameaçadas
pela violência generalizada, a agressão estrangeira, os conflitos
internos, a violação maciça dos direitos humanos ou outras
circunstâncias que tenham perturbado gravemente a ordem pública
(Declaração de Cartagena).

Em um contexto social, considerando que por meio da lei brasileira tem se inserido
em sua própria constituição medidas que visam dar assistência aos recém-chegados, como
outrora já havia sido exposto, essa atividade torna-se possível mediante o trabalho em parceria
com o Comitê Nacional de Refugiados-CONARE, o Estado Brasileiro, com seu instrumento
de mediação sendo efetuado através da Polícia Federal. Com cautela, tem-se trabalhado com
base na hipótese da violência generalizada, a fim de conter a massa de deslocados. A acolhida
de refugiados no Brasil decorre por meio da participação da Cáritas Arquidiocesana de São
Paulo- CASP, ACNUR, ONU. As duas cidades brasileiras que tem trabalhado no atendimento
a refugiados no país são: São Paulo e Rio de Janeiro. Desde 1994 ocorrem trabalhos no Centro
de Acolhida para Refugiados, cuja função é auxiliar e orientar essa nova população em
território nacional (SILVA, 2012, p.33).

2.3 Nova Lei de Migração e suas implicações
Em 2017 foi publicado em diversos sites como G1, Folha Uol e BBC material
jornalístico a respeito da nova Lei de Migração de autoria do atual Ministro das Relações
Exteriores, senador Aloysio Nunes (PSDB-SP). O objetivo do documento está centrado em
estabelecer direitos para migrantes e turistas no Brasil, enxergando o migrante como um
sujeito de direitos, independentemente de sua nacionalidade, o documento promove o combate
a qualquer tipo de discriminação e xenofobia, reconhecendo a necessidade individual de cada
pessoa, seja ele um apátrida ou migrante, ressalta a contribuição expressiva dos migrantes na
economia nacional.
A Nova Lei representa um salto na melhoria ao que se refere a seguridade daqueles
que já estão em solo brasileiro, aos que ainda irão adentrar o país e abrangendo também aos
brasileiros que emigraram para outros países. Um dos avanços significativos está no término

44

do anacronismo do Estatuto dos Estrangeiros, o qual foi elaborado com base num regime de
exceção (OLIVEIRA, 2017). Uma das características que se destacam na Lei 13.445/17 é a
ênfase em garantir o cumprimento dos direitos dos migrantes, como a definição dos tipos de
mobilidade ressaltando a respeito dos deveres do visitante e migrante, assim como descreve o
em seu Artigo 1º:
§ 1o Para os fins desta Lei, considera-se:
I - (VETADO);
II - imigrante: pessoa nacional de outro país ou apátrida que
trabalha ou reside e se estabelece temporária ou definitivamente no
Brasil;
III - emigrante: brasileiro que se estabelece temporária ou
definitivamente no exterior;
IV - residente fronteiriço: pessoa nacional de país limítrofe ou
apátrida que conserva a sua residência habitual em município
fronteiriço de país vizinho;
V - visitante: pessoa nacional de outro país ou apátrida que vem ao
Brasil para estadas de curta duração, sem pretensão de se
estabelecer temporária ou definitivamente no território nacional;
VI - apátrida: pessoa que não seja considerada como nacional por
nenhum Estado, segundo a sua legislação, nos termos da
Convenção sobre o Estatuto dos Apátridas, de 1954, promulgada
pelo Decreto nº 4.246, de 22 de maio de 2002, ou assim
reconhecida pelo Estado brasileiro.

Contudo, apesar da Lei 13.445/17 garantir a seguridade dos direitos humanos para os
estrangeiros em território brasileiro, a promulgação do documento tem causado um mal estar
nos nativos, por entender que a Lei em vigor concederá uma maior abertura para o ingresso
de novos migrantes, e a facilidade dos mesmos em permanecer no Brasil. De acordo com
artigo publicado no site da Gazeta do Povo26 em 02 de abril de 2017, as críticas referentes a
nova Lei dizem respeito a possível ameaça ao bem estar social brasileiro:
Entre as críticas mais comuns, estão o receio de que as novas
regras abram as portas para o terrorismo internacional no
Brasil, a previsão de que indígenas poderão transitar sem
empecilhos pelas fronteiras, o que foi levantado pelo senador
Ronaldo Caiado (DEM-GO) durante a votação, e a previsão
de igualdade de tratamento entre brasileiros e estrangeiros no
acesso a direitos sociais. (Gazeta do Povo)

26

Nova Lei de Migração enfatiza direitos humanos, mas críticos pedem veto. Disponível em:
http://www.gazetadopovo.com.br/justica/nova-lei-de-migracao-enfatiza-direitos-humanos-mas-criticos-pedemveto-73gx8w8g94mjekn4rvtzb982c. Acesso em 29 de março de 2018.

45

De acordo com Elias (1994:72) no que concerne às relações humanas e sociais os
indivíduos estão intricados e detidos em um círculo vicioso, o qual está relacionado ao
discurso e pensamento de um determinado padrão social. Segundo ele, quanto mais a coesão
social é ameaçada com tensões e conflitos incontroláveis, como por exemplo, o crescimento
maciço do fluxo migratório, o relacionamento entre esses recém-chegados e os estabelecidos,
suscitará sentimentos e fantasias coletivas que desenvolverão um estigma sobre aquele
considerado indesejado. Dessa forma, havendo uma segregação entre os indivíduos,
evidenciando ao grupo nativo a existência a relação de poder que eles, por serem autóctone
possuem sob o outsider, reafirmando a inferioridade do estrangeiro e subjugando-o como
inferior e inerentemente mal. O outsider é estigmatizado, excluído, e seu valor é reduzido,
diante da superioridade social que os estabelecidos mantém.
O estigma acerca do “indesejado” pode ser analisado como uma forma subjetiva em
rotular o grupo, permitindo que a classe dominante detenha os meios de poder em seu
detrimento. Contudo, apesar do distanciamento entre nativo e recém-chegado, Elias (1994:72)
afirmará que o conflito torna a sociedade mais coesa. E um dos métodos de sujeição que
permeiam entre as camadas sociais e que são internalizadas no corpo, garantindo a coesão está
na produção de poder, e como isso está presente nos mais variados dispositivos de vigilância
e dominação.
Os dispositivos que se destacam na nova lei, referem-se ao combate a xenofobia,
inclusão social do indivíduo, acesso igualitário de serviços e programas sociais, o direito à
liberdade civil e social como também a reunificação familiar. De acordo com OLIVEIRA
(2017) o desafio enfrentado pela regulamentação da Lei diz respeito aos vetos27 que foram
expostos pelo Presidente da República. Onde foi vetada a anistia ao indivíduo que até julho
de 2016 adentrou no país, foi vetado também o direito em exercer qualquer cargo público.
Segundo Oliveira (2017) outro desafio está relacionado à organização de alguns segmentos
sociais contrários ao que foi estabelecido na nova lei, originando, ainda que de forma sutil,
manifestações contra a promulgação do documento.
Embora encontremos avanços significativos quanto à garantia e efetivação dos
direitos voltados para as vítimas de deslocamento forçado, a crise migratória ainda caracteriza

27

Apesar de vetos de Temer, essência da Lei de Migração é mantida. Disponível em:
http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2017/05/1887133-temer-cede-a-pressao-e-sanciona-com-vetos-novalei-da-migracao.shtml Acesso em 29 de março de 2018.

46

o refugiado, apátrida e imigrante como uma ameaça. Em conformidade a isso, Moraes (2017)
afirmará que tanto a permanência dessas pessoas e a concessão do status de refugiado estão
pautadas em um interesse do Estado, seja ele fundamentado na questão voltada para segurança
nacional, como também para a economia do país. O saldo positivo ressaltado por Moraes
(2017) refere-se ao Estado enxergar uma vantagem econômica em receber esses deslocados,
considerando que o outsider tona-se uma força de trabalho em potencial.
Ao ser inserido na comunidade, o refugiado se enquadrará às categorias que
estruturam o local que agora ele se encontra. Suas atribuições individuais não se torna um
atributo relevante à nova realidade, o mesmo estará subordinado ao que lhe foi proposto. A
despeito disto, ressalta-se a diretriz vetada, a qual não permite o ingresso dessas pessoas em
cargos públicos. Contudo, é outorgado o acesso a serviços e programas públicos, assim como
dispõe o Art. 4º da Lei 13.445/17:

Art. 4º Ao migrante é garantida no território nacional, em condição
de igualdade com os nacionais, a inviolabilidade do direito à vida,
à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, bem como
são assegurados:
VIII - acesso a serviços públicos de saúde e de assistência social e
à previdência social, nos termos da lei, sem discriminação em
razão da nacionalidade e da condição migratória; IX - amplo
acesso à justiça e à assistência jurídica integral gratuita aos que
comprovarem insuficiência de recursos; X - direito à educação
pública, vedada a discriminação em razão da nacionalidade e da
condição migratória.

Ainda que a nova Lei venha com o intuito de proporcionar o acesso aos direitos
desses deslocados de uma forma ágil, o Brasil ainda enfrenta outra problemática pertinente
que é a concessão de asilo. Conforme nota publicada no site do G128 em 03 de março de 2018,
cerca de 86 mil estrangeiros aguardam resposta sobre refúgio, o Comitê Nacional para
Refugiados conta apenas com 14 funcionários responsáveis por realizar o procedimento de
triagem. No ano de 2016 eram 06 funcionários para atender o crescente fluxo migratório e de
refugiado. Em 2017 a fila de espera registrava aproximadamente 33.866 solicitações de
refúgio, desse total, cerca 1.179 foram avaliados ainda em 2017, os solicitantes têm aguardado

28

Brasil tem 86 mil estrangeiros aguardando resposta sobre refúgio e 14 funcionários para avaliar pedidos.
Disponível em: https://g1.globo.com/mundo/noticia/brasil-tem-86-mil-estrangeiros-aguardando-resposta-sobrerefugio-e-14-funcionarios-para-avaliar-pedidos.ghtml. Acesso em 29 de março de 2018.

47

em média cerca de dois anos pela aprovação ou não do seu pedido. Enquanto isso é concedido
a essas pessoas um protocolo provisório, o qual garante o acesso a direitos básicos.
Em 2017 foram aprovadas cerca 40,1% solicitação de refúgio, o número compreende
a 1.179 solicitações, dentre esses 473 pedidos foram aprovados, enquanto 706 foram negados.
A grande maioria que teve o pedido negado, alegou a motivação econômica, contudo, essa
alegação não configura refúgio. É imprescindível destacar que qualquer pessoa pode solicitar
refúgio, todavia, a solicitação será estudada para confirmar se o solicitante se enquadra no
perfil de refugiado. A situação dos venezuelanos ganhou notoriedade do governo brasileiro,
só em 2017 17.86529 venezuelanos solicitaram refúgio, porém, essas solicitações não foram
aprovadas. De acordo com Bernardo Laferté, coordenador do CONARE, o governo tem
analisado estratégias que possam solucionar essa nova demanda. A instabilidade política na
Venezuela tem contribuído para o aumento de solicitações de refúgio no Brasil.
GRÁFICO 4: Solicitação de Reconhecimento da Condição de Refugiado em 2017

Venezuela
Cuba
2.373
Haiti
2.362
Angola
2.036
China 1.462
Senegal 1.221
Síria 823
Nigéria 549
Bangladesh 523
Rep. Dem… 364
Guiné Bissau 338
Guiné 277
Paquistão 267
Líbano 223
Outros
3.183
0

17.865

5.000

10.000

15.000

20.000

TOTAL: 33.866

Fonte: Polícia Federal

29

Brasil registra número recorde de solicitações de refúgio em 2017. Disponível em
https://g1.globo.com/mundo/noticia/brasil-registra-numero-recorde-de-solicitacoes-de-refugio-em-2017.ghtml.
Acesso em 29 de março de 2018.

48

Desde 2015 Roraima tem sido a cidade brasileira que tem recebido um número
expressivo de venezuelanos, estima-se que há cerca de 40 mil30 só na capital Boa Vista.
Considerando a fragilidade da atual situação, deve ser analisada de maneira minuciosa a
necessidade de atendimento dos venezuelanos, haja vista que nem todos irão se enquadrar no
que caracteriza uma pessoa refugiada. A essas vítimas não se pode classificar seu
deslocamento como se estivesse relacionado apenas pela instabilidade econômica de seu país,
deve-se considerar que há aqueles que foram motivados a partirem do seu país por sofrerem
perseguição devido ao seu posicionamento político.
Várias unidades federativas do país receberam solicitações de reconhecimento na
condição de refugiado, sendo também elas: AL (10), AP (93), BA (65), CE (157), ES (31),
GO (108), MA (28), MS (96), MT (156), PA (57), PB (9), PE (61), PI (1), RN (26), RO (141),
SE (15), TO (11). A somatória das solicitações dessas unidades totalizam 4% da solicitação
de reconhecimento só no ano de 2017.
GRÁFICO 5: Solicitação de Reconhecimento da Condição de Refugiado por
Unidade Federativa em 2017

18.000
16.000
14.000

15.955
47%

12.000

9.591
28%

10.000
8.000
6.000
2.864
8%

4.000
2.000

701
2%

329
1%

237
1%

AC

DF

MG

0
RR

AM

SP

766
2%

767
2%

921
3%

670
2%

PR

RS

SC

RJ

Outros: 4%

Fonte: Polícia Federal. Gráfico criado pela autora

30

Fuga da fome: como a chegada de 40 mil venezuelanos transformou Boa Vista. Disponível em:
https://g1.globo.com/rr/roraima/noticia/fuga-da-fome-como-a-chegada-de-40-mil-venezuelanos-transformouboa-vista.ghtml. Acesso em 29 de março de 2018.

49

De acordo com Jarochinski (2017) os migrantes venezuelanos têm solicitado o status
de refugiados, considerando que é uma forma mais eficaz para ser obter a regularização
migratória, como também os documentos necessários que permitem o ingresso no mercado de
trabalho. A presença dos venezuelanos em Boa Vista tem causado nos nativos tensões,
segundo reportagem do site G1 divulgada em 20 de março de 2018, · os moradores do sul de
Roraima expulsaram venezuelanos de um prédio abandonando, queimando roupas e objetos.
De acordo com a repórter Erica Figueiredo cerca de 300 pessoas que residem em Mucajaí-RR
organizaram um protesto, após um nativo ser assassinado, segundo familiares da vítima, por
um venezuelano. Os nativos exigem das autoridades que os outsiders deixem a cidade.
A precariedade na condição de vida dos venezuelanos tem conduzindo-os a soluções
clandestinas. Mesmo que a situação de vida dessas pessoas não seja constituída de uma
maneira ilegal, esse quadro passa a configurar entre a dependência da assistência humanitária
e uma iniciativa clandestina que está fundamentado no trabalho informal (Agier, 2006, p.206).
Em Roraima tornou-se comum encontrar venezuelanos pedindo nas ruas uma oportunidade
de emprego:

À medida que aumenta a entrada de venezuelanos no país à
procura de emprego, aumentam também as denúncias de
contratações irregulares. Há três meses, por exemplo, quatro
venezuelanos foram resgatados de uma empresa onde
trabalhavam em condições análogas a de escravos, segundo
o MTE-RR. O chefe da Fiscalização de Trabalho, Aécio
Andrada, disse que muitas empresas se aproveitam das
condições de vulnerabilidade dos venezuelanos para fazer
contrações irregulares. (Reportagem divulgada pelo G1, 29
de julho de 2017)31

A imagem do refugiado marginal, que necessita ser contido pela polícia, reforça a
estratégia de segurança do Estado, a qual rejeita o indesejado como cidadão, enxergando-o
como problema (Agier, 2006, p.205). O abandono institucional, seja ele resultado do tempo
de espera para se obter a resposta da solicitação de refúgio, acentuam as alternativas de
sobrevivência dessas vítimas de deslocamento forçado, onde se atribui medidas ilegais, cuja

31

Fugindo da crise na Venezuela, imigrantes tentam emprego em RR e pedidos de carteira de trabalho

disparam. Disponível em: https://g1.globo.com/rr/roraima/noticia/fugindo-da-crise-na-venezuela-imigrantestentam-emprego-em-rr-e-pedidos-de-carteira-de-trabalho-disparam.ghtml. Acesso em 02 de abril de 2018.

50

iniciativa está fora dos modelos convencionais de sobrevivência. Tal ação intensifica a
ilegalidade na contratação de mão de obra barata, como o estigma e as ações xenofóbicas em
objeção a esses indivíduos.
É notório observarmos que conforme os dados apresentados nos gráficos ao longo
desse trabalho, que desde o ano de 2010 a situação desses refugiados no país se agravam de
forma gradativa, onde eles sofrem privações nos níveis mais diversos, seja no acesso à
educação, até a conquista de um emprego. O olhar de repreensão dos estabelecidos reafirma
para os que atravessam a fronteira que essa terra não lhes pertence. Além da grande dificuldade
em ser inserido no mercado de trabalho, o refugiado sofre com a espera indeterminada na
solicitação de concessão de refúgio no país acolhedor. A discriminação e ações xenofóbicas
constroem uma barreira na adaptação desses indivíduos.
A forma como o refugiado é percebido pela comunidade acolhedora, tem como
influência aquilo que os nativos sabem sobre o conflito que os fizera se deslocarem do país de
origem para outro lugar. Essa função de apresentar o outro tem cada vez mais como
responsável os meios de comunicação, tendo em vista que é a mídia que possui essa tarefa de
dizer quem é esse que se difere da comunidade, a forma que a imagem do refugiado é
apresentada à sociedade influenciará as opiniões dos demais atores sociais. De acordo com
Almeida (2017) a mídia induz a população de forma inteligente como perceber esse “outro”,
fazendo-os acreditar que suas opiniões acerca desse fenômeno foram construídas por eles, sem
sofrer influência externa. Portanto, a utilização do biopoder como instrumento de dominação,
que dita regras, influencia na construção do imaginário social, estabelecendo o que deve ser
pensado tem sido adotado pela mídia como um mecanismo regulador na nova configuração
da relação social.

51

CAPÍTULO 3: DA CONSTRUÇÃO DO IMAGINÁRIO SOCIAL
3.1 Biopoder como agente normalizador do conflito
O fenômeno social que tem se tornado manchete em diversos meios de comunicação
é oficialmente declarado pelo ACNUR como uma “crise dos refugiados”. SOUZA (2016)
afirma que “a crise é a normalidade de um regime de governo de biopoder”, pois ele não
distinguirá apenas o indivíduo pelo critério político, cultural ou até mesmo relacionado à etnia,
o biopoder criará uma nova distinção que construirá a imagem do refugiado, apresentando
quem é ou não indesejado no local de recebimento. Acentuando o regime de exceção, onde
sua gênese se dá numa esfera de sujeição e exploração daqueles que não são bem vindos.
Compreende-se, portanto, que a origem da sociedade moderna possui em sua gênese a crise e
exploração como origem e fundamento. O êxodo como fenômeno passa por uma
metamorfose, se outrora os conflitos envoltos na dispersão humana tinham como fator
preponderante a escravidão, bem como o colonialismo e a subtração e exploração humana, no
cenário atual os métodos de poder para subverter o êxodo são reconfigurados de acordo com
a relação de biopoder vigente, os métodos de sujeição e abuso de poder são moldados,
tornando-se um regulador social moderno, através dos mecanismos de controle desenvolvidos.
A noção de poder de acordo com Foucault (1987) possui um aspecto mutável, tendo
em vista que seu método de agir no corpo social muda conforme as alterações temporais dos
conflitos sociais. Destarte, entende-se que o poder encontra-se nas formas institucionalizadas
como a lei e o Estado, não se restringindo apenas a essas esferas, mas também é analisado
como elemento onipresente. A finalidade do poder é tornar os corpos sociais dóceis e uteis,
agindo com submissão as “regras do jogo” estabelecidos pelas instituições e regimes políticos.
Assim como toda a vida social, os refugiados, especificamente, tornaram-se objeto de controle
tendo suas atividades mais simples do dia a dia administradas com base no biopoder.
Assim como nos corpos sociais, a docilidade discutida por Foucault (1987) está
fundamentado no objetivo em exercer sobre o indivíduo uma coerção, trabalhando no corpo
ativo, em suas atitudes e gestos. Por meio de normas as ações dos indivíduos passam a ser
reguladas, separando, portanto, o normal (nativo) daquilo que é anormal ou considerado como
uma patologia social (refugiado). Para Simmel (1983) o conflito pode proporcionar interações
sociais, sendo ele quem desfigura uma dada estrutura, como também pode purifica-la. “O
poder unificador do princípio do conflito não surge com mais força em nenhum outro do que
quando produz uma associação temporal ou real e circunstancias de competição ou de
hostilidade” (ibidem: p.160). Ou seja, o conflito é um elemento que propicia a interação social

52

de grupos antagônicos, quiçá essa seja uma das virtudes do mesmo. Por ser um elemento
construtivo nas mudanças sociais, considera-o, portanto, como um regulador nas relações
humanas.
A presença do refugiado venezuelano no Brasil é dotada de uma ambivalência. Se
por um lado há uma curiosidade por parte da comunidade receptora, das instituições nãogovernamentais e voluntários humanitários a respeito da vida que ultrapassa a fronteira, existe
também a estranheza relacionada à presença do recém-chegado, cuja figura remete no
imaginário social à concepção de que aquele que vem de longe é uma ameaça, um sujeito
perigoso e enigmático, que de acordo com Magalhães (2013) não se pode menosprezar o efeito
que sua presença provoca nos nativos. Para Bauman (2017) esses estranhos, que são resultados
da bestialidade das guerras, passam a ser observados como indesejados que causam ansiedade
e temor à comunidade receptora, tendo em vista que ao não se encaixarem nas normas que
estabelecem a comunidade receptora, passam a provocar no grupo uma desestabilização à vida
confortável e convencional.
A tentativa do refugiado de se adequar ao novo local, não ocorre por meio de uma
ação natural, seu processo de inserção se dá por meio de mecanismos que disciplinam seus
corpos, adestrando seu comportamento. É entendido que o poder não se encontra em um único
espaço social, ele perpassa por todas as esferas sociais. Assim, a mídia é também observada
como mecanismo de instrumentalização de controle e regulamentação, sendo responsável por
exercer uma atividade que vai além de uma escala micro, pois é a partir da construção de
informações compartilhadas que os indivíduos passam a desenvolver um posicionamento a
respeito do conteúdo “fabricado”. Ao introduzir o outsider na comunidade receptora com base
nas notícias, sem possuir uma preocupação em explicar de forma clara a todos sobre tal
fenômeno, pode-se observar a influência da mídia que é sustentada pelo biopoder, a qual
poderá disciplinar como também regulamentar a imagem do refugiado que será interpretada
pelos estabelecidos.

3.2 A influência da mídia como mecanismo de biopoder na construção da imagem do
Refugiado
A entrada de refugiados em outro país pode desenvolver nos nativos que os recebem
uma desestabilização no que se refere ao seu sentimento de segurança. De acordo com Moulin
(2012) o conceito de segurança humana se emprega ao refugiado na concepção de haver

53

necessidade em garantir a ele proteção de direitos humanos, além de oferecer condições de
vida humana significativa. O autor continua afirmando que segundo uma lógica cidadãoterritório-Estado, os direitos do homem, numa perspectiva moderna, somente estarão
garantidos se os refugiados incorporarem a figura do cidadão, onde se deve cumprir as normas
já impostas na estrutura social.
Por estar em um ambiente ignoto, cuja cultura e idioma lhes são diferentes de tudo
que outrora fora familiar, a nova comunidade se apresenta, por vezes, receosa e preconceituosa
com sua presença na estrutura social da comunidade receptora (SILVA; FERREIRA;
GARCIA, 2016. p.120). Diante disso, a vulnerabilidade em que o refugiado é exposto após o
seu deslocamento não encerra ao se chegar ao país acolhedor. A mídia entra nesse cenário
como um instrumento discursivo que define a realidade, agindo como um poder disciplinar,
cuja interpretação a respeito do outro é atribuída àquilo que é exposto pelo jornalismo, tendo
como mediador a cultura (GASTALDO; BRITTOS, 2006). A realidade de um determinado
grupo é organizada pela estrutura cultural, a qual regula as práticas e ações de seus atores
sociais. Dessa forma, o poder disciplinar está presente no discurso apresentado pela mídia, seu
impacto será observado na forma que se constrói a imagem do refugiado. O processo de
construção envolve as relações e desconexões de informações, como também a seleção e os
descartes das mesmas, cumprindo assim, as normas de edição e apresentação jornalística sobre
o tema.
Compreendemos ao longo da discussão a terminologia que define refugiado como
uma pessoa que devido à violência generalizada, temor fundado em perseguição política ou
religiosa foi forçado a buscar refúgio em outro lugar. Todavia, apesar de haver uma distinção
entre os termos jurídicos “migrante” e “refugiado” a utilização inadequada para tratar
fenômenos distintos pode causar danos significativos. Tal equívoco referente aos termos
jurídicos a respeito desse fenômeno social passa a ser visível diante das notícias veiculadas
pela mídia.
A mídia ganha um espaço amplo e significativo, onde sua interação social recebe
uma centralidade no que se refere à comunicação, considerando que essa interação é algo
intrínseco ao homem. Assim, ressalta-se o efeito em longo prazo que a mídia possui. Ao
analisar as informações veiculadas nesses órgãos de comunicação observamos que não há uma
preocupação em se fazer a diferenciação jurídica existente para caracterizar o fluxo de
deslocamento. Ademais, a exibição de algumas notícias pode desenvolver temor, hostilidade
e reforçar ações xenofóbicas naqueles cidadãos do país receptor que não conhecem a distinção

54

de cada categoria. Destaco, portanto, a necessidade de se fazer entender cada terminologia, de
acordo com sua definição já estabelecida por meio dos instrumentos internacionais:

1. Refugiado: Não possuem proteção no próprio país, são vítimas de violência
generalizadas, produtos de perseguição étnica, religiosa, gênero e política.
Sua proteção está fundamentada em caráter de urgência, eles possuem a
garantia do non-refoulement (não devolução).
2. Solicitante de refúgio: Trata-se de alguém que apresenta as autoridades
competentes seu pedido de refúgio, seu pedido é avaliado por órgãos
competentes que analisam as solicitações. O solicitante de refúgio e o
refugiado não podem ser enviados a países ou fronteiras que coloquem sua
vida em risco.
3. Deslocado Interno: São vítimas de violência generalizada, contudo elas não
ultrapassam a fronteira, diferentemente do refugiado, os deslocados internos
possuem auxílio do próprio governo.
4. Migrantes Internacionais: É aquele que vive em outro país por motivos
econômicos, se estabelecendo de forma temporária ou permanente. Eles não
recebem proteção e assistência do ACNUR, pois sua presença em outro país
tem como motivação uma melhoria na condição de vida e uma melhor
oportunidade de trabalho.
5. Apátridas: Pessoas que não possuem nacionalidade, isso ocorre devido a
discriminação contra minorias e conflitos de leis entre países. Essas pessoas
não recebem proteção do Estado.
6. Retornados: Aqueles que voluntariamente decidem retornar ao país de
origem.
Além da proteção que esses atores necessitam, se faz necessário a apresentação da
particularidade desse fenômeno, separando-os de acordo com suas especificidades. Diante
disso enfatiza-se a atuação da comunicação midiática em expor a informação de forma
completa e não fragmentada. Em consoante a afirmação de (SCREMIN,2016) “as políticas
migratórias estão caracterizadas por políticas de controle”, os Estados acolhedores
desempenham ações em proteger as fronteiras, cujo objetivo está em controlar o fluxo,
reprimindo aquele que vem de longe, e acentuando a fabricação das representações sociais por
meio da comunicação e reforçando o estereótipo negativo do outsider.

55

No dia 08 de agosto de 2018 foi publicada uma entrevista32 onde a senadora Ângela
Portela e o deputado federal Jhonatan de Jesus, ambos de Roraima, se pronunciam a respeito
do fluxo venezuelano cruzando a fronteira, frente ao que foi publicado é notório a confusão
dos políticos em tratar como crise migratória, sem levar em consideração a particularidade
que cada fenômeno possui e reforçando o pânico moral em abranger o total de venezuelanos
que chegam à Boa Vista, sem separa-los conforme sua classificação jurídica.
O deputado federal Jhonatan de Jesus (PRB) disse que a decisão
do Juiz Federal Hélder Girão Barreto, apesar de ter vigorado
apenas por algumas horas, colocou uma luz sobre a crueldade dos
problemas gerados para venezuelanos e brasileiros, em função do
fluxo migratório desordenado que já despejou em Roraima –
segundo ele – cerca de 150 mil pessoas das quais pelo menos 100
mil permanecem na capital Boa Vista e em outras cidades do
interior.

De acordo com (MENDONÇA; TEMER, 2015 p.196) a mídia passa a se estruturar
como algo particular no contexto social, onde a interação entre os indivíduos e os meios de
comunicação passa a definir essa relação. Logo, é a mídia que constrói uma realidade,
colocando-a em um campo de ampla visibilidade, utilizando como base teórica ou de hipótese
a Agenda Setting.33 Tal teoria possui uma relevância numa perspectiva a longo prazo
influenciando o modo de pensar e falar daquele que recebe a notícia. Dessa forma, entende-se
que a mídia corrobora com a construção do imaginário social, considerando que os atores
sociais, em sua grande maioria, não tem acesso de forma profunda aos acontecimentos.
Uma matéria com um título bem tendencioso publicado em 25 de dezembro de 2016
no site do G1, colocou em um mesmo artigo a história de migrantes e refugiados. Contudo,
suas especificidades não foram descritas, na matéria cujo título “Refugiados buscam emprego

32

Políticos
de
Roraima
falam
sobre
migração
na
fronteira.
Disponível
em:
http://folhabv.com.br/noticia/Politicos-de-Roraima-falam-sobre-migracao-na-fronteira/42705. Acesso em 08 de
Agosto de 2018.
33
Trata-se da teoria que aborda como os meios de comunicação dão ênfase a determinado assunto, influenciando
os indivíduos que recebem a notícia, fazendo-os colocar como prioridade aquilo que foi exibido. De acordo com
(CASTRO, 2014) A hipótese está centrada na eficácia de se definir um elemento para agenda pública, e assim
persuadir a percepção de mundo do sujeito. A Agenda-Setting surgiu na década de 1970 a partir de estudos de
dois professores da Universidade da Carolina do Norte, Donald L. Shaw e Maxwell McCombs. Disponível em:
http://seer.ufrgs.br/index.php/intexto/article/viewFile/46390/32217. Acesso em 11 de agosto de 2018.

56
no Brasil para mudar de vida” dá a entender para aqueles que não possuem o conhecimento
jurídico a respeito das terminologias, que a principal razão do refugiado adentrar em solo
brasileiro é a procura de emprego. Além disso, nota-se o equívoco em classificar o migrante
como refugiado.
Alcius Elmira, de 27 anos, é haitiano e está no Brasil em julho de 2014.
Ele é casado e tem dois filhos que ficaram no Haiti. Formado em
farmácia e com cursos técnicos em enfermagem e produtos químicos,
ele veio para cá em busca de oportunidades para melhorar a vida da
sua família. “O país está sempre em crise e o governo não ajuda. Eu
estudei tanto e poderia ajudar o país. A maioria viajou para outros
países para ter uma vida melhor”, conta.34

Espera-se, a priori, que os meios de comunicação como principal agente
influenciador na sociedade globalizada tenham a função de informar e não incitar ações
xenofóbicas e a insatisfação da população em receber os refugiados.
De acordo com Barros (2015) os meios de comunicação trabalham diretamente na
produção de valores que norteiam a vida dos indivíduos por meio da representação e
construção do outro. Numa perspectiva macrossociológica, a mídia passa a desenvolver
atividades, cujas notícias divulgadas controlam o âmbito social. Tal afirmação é perceptível
sendo analisadas por meio das seguintes categorias: (1) vigilância do meio social, (2)
interpretação das informações noticiadas e (3) transmissão dos valores culturais, (Barros,
2015, p.193).
É necessário haver uma cautela ao publicar uma matéria a respeito de uma temática
delicada e complexa, considerando que esse fenômeno social diante de toda a situação de
tensão que há a respeito das vítimas, exige um olhar mais prudente para aqueles que são
responsáveis em transmitir de forma clara a complexidade do evento. Com isso, é de extrema
importância que a mídia compreenda que não há uma definição internacional para “migrante”,
segundo o ACNUR35 há uma ação errônea praticada pelos meios de comunicação, organizações
internacionais e formuladores em política que é usar o termo migrante de forma generalista. Um grande

34

Refugiados buscam emprego no Brasil para mudar de vida: País abriga 8,8 mil refugiados, foram registrados
28.670
pedidos
de
refúgio,
segundo
o
Ministério
da
Justiça.
Disponível
em:
https://g1.globo.com/economia/concursos-e-emprego/noticia/refugiados-buscam-emprego-no-brasil-paramudar-de-vida.ghtml. Acesso em 11 de agosto de 2018
35
“Refugiados”
e
“Migrantes”:
Perguntas
frequentes.
Disponível
em:
http://www.acnur.org/portugues/2016/03/22/refugiados-e-migrantes-perguntas-frequentes/. Acesso em 11 de
agosto de 2018.

57
exemplo disso são as estatísticas globais que definem “migração internacional” como um fenômeno
que compreende os refugiados e solicitantes de refúgio.
O biopoder possui uma variabilidade sobre as relações, sendo ele usado como
justificativa ou explicação para os comportamentos entre os indivíduos. Sua aplicabilidade
pode ser observada em várias óticas, a mais evidente que podemos tomar como exemplo é o
relacionamento de dominação de uma classe em detrimento de outra. O biopoder nessa
situação será utilizado como meio de controle, uma voz de comando a fim de organizar e
definir decisões que tornem possível o bem estar social. As escolhas tomadas por aqueles que
detém tal autoridade poderá executar ações que julguem estar garantindo a seguridade da
comunidade, seja controlando quem entra ou sai, tais ações podem estar apoiadas por
mecanismos jurídicos e políticos. Recentemente, os refugiados venezuelanos que estavam
prestes a cruzar a fronteira enfrentaram um obstáculo, sua entrada no país foi vetada, cujo
argumento para sustentabilidade dessa ação estava pautado no fato de que a presença deles no
país estava gerando impactos negativos na cidade de Boa vista.

Decreto estadual e veto a entrada de venezuelanos no país
No dia 1º, a governadora Suely Campos (PP) assinou o decreto
25.681 limitando serviços a estrangeiros sob a justificativa de que o
fluxo migratório de venezuelanos tem causado impactos em todos os
setores do estado.Entre as normas criadas pelo governo estão a
restrição de atendimentos a serviços públicos de pelo menos quatro
secretarias (Saúde, Educação, Segurança, e Trabalho e Bem Estar
Social) somente a estrangeiros com passaporte e deportação de
imigrantes envolvidos em crimes. (Fonte: G1)36

O poder utilizado como autoridade e soberania passa a dividir os indivíduos,
isolando-os e como forma de poder punitivo suas ações passam a ser vigiadas. De acordo com
Oling (2017) a carga negativa depositada sobre o refugiado como um “problema”, reflete uma
política equivocada, onde não há modelo ou solução que possam lidar de forma mais efetiva
com atual crise. As ações dos países receptores têm contribuído para que cada vez mais a

36

Fronteira do Brasil com a Venezuela é fechada após decisão judicial, diz PRF. Disponível em:
https://g1.globo.com/rr/roraima/noticia/2018/08/06/fronteira-do-brasil-com-a-venezuela-e-fechada-apos-decisao-judicial-diz-prf.ghtml .
Acesso em 11 de agosto de 2018.

58

busca por uma solução aconteça de forma tardia. Oling (2017) ressalta três práticas que
reforçam que o refugiado não é bem-vindo. A primeira faz menção à ação do país receptor em
impedir a chegada desses outsiders, a segunda diz respeito à conduta da comunidade autóctone
em evitar a entrada do refugiado no território, tal prática reflete o veto na admissão dos
venezuelanos em solo brasileiro. Por fim, a terceira prática trata da ação que força o refugiado
a desistir de permanecer no país receptor, seja pela exploração de mão de obra barata, como
o veto ao acesso à saúde, educação e um emprego regular.
3.3 O Refugiado apresentado pela mídia e o impacto em sua inserção na comunidade
acolhedora
A partir do que já foi discutido acerca da construção da imagem do refugiado, é de
extrema importância ressaltar o impacto que as informações compartilhadas pelos meios de
comunicação podem causar, influenciando de forma negativa a formação da opinião pública,
tornando a vítima (refugiado) um problema. De certo, sabe-se que o teor das edições realizadas
nos conteúdos jornalísticos podem sofrer influências internas e externas, conforme o
posicionamento ideológico adotado pelo patrocinador ou a própria agência. Isso também
definirá como a informação chegará ao público. A vulnerabilidade exposta nesse processo de
construção do outro faz “propagar a crescente fragilidade das posições sociais e instabilidade
das identidades” (BAUMAN, 2016, P.33). É perceptível essa instabilidade citada pelo
sociólogo Bauman, durante o contato que pude ter com os refugiados em Roraima. A rejeição
dos nativos em receber e abrir as portas do mercado de trabalho para os refugiados
venezuelanos está pautada no raciocínio de que esses outsiders estão aqui para roubar os
empregos dos brasileiros, reafirmando que aquele que vem de longe tem se tornado um
problema para a população brasileira.
De acordo com Souza (2016) a crise carrega consigo a generalização de violência
contra os migrantes, refugiados e deslocados, tal crise os tornou perseguidos em terra estranha,
a razão de isso acontecer envolve o simples ato de proteger a si mesmo, fugindo do país de
origem, buscando em terra estranha a segurança que lá não existe mais. Contudo, o refugiado
para a comunidade acolhedora é aquele que trouxe instabilidade na segurança, sua imagem
passa a ser associada a grupos terroristas, ao tráfico humano, a grupos desordeiros, “não
importa que esteja ele mesmo fugindo dos terroristas ou esteja buscando proteger-se do terror
que o seu próprio estado lhe inflige. Ele se torna apenas a justificativa para a ampliação dos

59

investimentos em segurança e repressão nas fronteiras e para seu próprio encarceramento em
subordinação, medo e culpa” (Souza, 2016, p. 118).
A presença indesejada do refugiado em solo brasileiro, tem acarretado na exploração
de mão de obra barata. Sem perspectiva em uma mudança significativa de vida, os refugiados
venezuelanos têm trabalhado em troca de uma refeição, muitas vezes em condições insalubres.
A relação do refugiado como indesejado diante dos indivíduos autóctones se configura em
uma relação de extraterritorialidade, que segundo Bauman (1999), evidencia a segregação e
separação entre esses indivíduos, que por sua vez acentua o hiato entre os padrões relacionais
de dignidade e humilhação. Assim, até mesmo aqueles que possuem uma formação
acadêmica, deparam-se com o novo, onde suas habilidades não são mais importantes, tendo
em vista que agora, a urgência está em ter recurso que possibilite a compra de alimento para
sobrevivência.
A jornada de peregrinação do refugiado não acaba após cruzar a fronteira, ao
contrário, ela inicia a partir da inserção do indivíduo no novo contexto social. As barreiras são
múltiplas, seja ela linguística, cultural ou social. Ao adentrar na nova terra a necessidade
imediata desses recém-chegados está em conseguir um emprego para a própria subsistência,
como também ajudar os familiares que permanecem no local de origem. E aqui se inicia mais
um desafio, a retirada de novos documentos, e a busca por um emprego.
Em Boa Vista, os trabalhos desenvolvidos em auxílio aos refugiados contam com a
colaboração da Polícia Federal, ONU, Serviço Jesuíta de Migração e Refugiados-SJMR37,
ACNUR e o CONARE. A instituição dos jesuítas (SJMR) trabalha com elaboração de
currículo em português, atuando em conjunto com empresas que buscam empregar essas
pessoas. Para poder fazer o currículo o indivíduo deve levar com ele para o prédio do SJMR
carteira de trabalho, protocolo da Polícia Federal, e o documento de identidade. Os jesuítas
trabalham em parceria com empresas em todo o Brasil que têm interesse em empregar esses
refugiados. Além do currículo, há também orientação a respeito da retirada de documentos
necessários para que o recém-chegado possa adentrar no mercado de trabalho, como também
utilizar dos serviços públicos. Todavia, apesar de haver uma parceria que colabore com a
inserção dessas pessoas no mercado de trabalho de forma segura, há casos daqueles que sem

37

Instituição da Companhia de Jesus que tem como objetivo acompanhar e defender os direitos dos migrantes e
solicitantes de refúgio. A missão da instituição está em proteger a dignidade e os direitos dessas população mais
vulnerável. Em Boa Vista o SJMR trabalha com o acompanhamento do processo de inclusão do migrante e
refugiado na sociedade e no poder público.

60

orientação de como proceder no novo país, ficam à mercê das ofertas empregatícias duvidosas.
Sua força de trabalho é explorada, e são expostos a situações sub-humanas. De acordo com o
jornal O Globo38, somente em 2018, 12 venezuelanos foram resgatados em situação
semelhante a trabalho escravo.
A crise de refugiados em solo nacional tem acentuado o conflito entre os recémchegados e os nativos, a rejeição e argumentos que sustentam a ideia de que os refugiados
usufruem dos serviços públicos, e adentram na nova terra com objetivo de tirar a autonomia
daqueles que aqui já estavam, reforça o estereótipo xenofóbico de que o refugiado é o
problema que deve ser retirado da sociedade. Para Simmel (1983) o conflito é um tipo de
associação entre os indivíduos, ele direciona as posições sociais reforçando a unidade de um
grupo em aversão ao outro, aproximando pessoas de grupos que de outra forma não se
relacionariam. Para o autor alemão “quanto mais puramente negativa ou destrutiva é uma
determinada inimizade, tanto mais facilmente será realizada uma unificação daqueles com os
quais comumente não tem nenhum outro motivo de qualquer associação” (SIMMEL, 183,
p.161). A situação dos moradores de Roraima se enquadra perfeitamente no que Simmel
afirma; o que aproxima esses indivíduos em uma unidade é a percepção de um inimigo
comum, que, inclusive, toma forma graças à atuação da comunicação midiática. Em Boa Vista
é comum ouvir argumentos que de os brasileiros devem se unir para se proteger da ameaça
personificada na pessoa do refugiado. É necessário superar esses muros levantados a respeito
dos recém-chegados, enxerga-los como vítimas, e desconstruir a ideia de que eles são
indesejados por não compartilharem dos mesmos valores morais e éticos que constituem a
sociedade receptora.

38

Escravidão Contemporânea: A Jornada de venezuelanos explorados no Brasil. Disponível em:
https://oglobo.globo.com/brasil/escravidao-contemporanea-jornada-de-venezuelanos-explorados-no-brasil22733290. Acesso em 15 de agosto de 2018.

61

CONSIDERAÇÕES FINAIS
A presente pesquisa pretendeu trazer uma discussão sobre o possível fator que tem
contribuído para a construção distorcida a respeito da pessoa refugiada, busquei trazer por
meio da experiência de campo, como também através das análises de noticiários e documentos
jurídicos a trajetória do refugiado e a construção de sua imagem apresentado a sociedade,
trazendo uma discussão e reflexão a respeito da atual crise. Ao longo do trabalho buscamos
problematizar questões que reforçam essa construção da imagem do refugiado como o
problema, e responsável pela desordem e insegurança social.
Os conflitos e a violação dos direitos humanos, a falta de conhecimento a respeito da
terminologia e a influência da mídia diante do atual fenômeno reforçam a relação de
insegurança, medo e insatisfação em receber essas pessoas. A partir disso, procuramos analisar
a relação do conflito com o biopoder, e como esse mecanismo de dominação tem sido utilizado
pelos meios de comunicação para dar ênfase a construção do imaginário social.
Conforme afirmação feita por Foucault (1987) a respeito do poder, sendo um
instrumento que perpassa por todas as estruturas sociais. Fica evidente na análise realizada no
último capítulo a presença latente desse mecanismo, e como ele tem sido desenvolvido para
moldar opiniões dos atores sociais, influenciando-os na recepção e a não aceitação dos que
vem de fora. Assim como os meios de comunicação, ressaltamos também a problemática na
efetivação de leis específicas que tem como objetivo atender as necessidades das vítimas desse
fenômeno social. Entendemos que desde o início os deslocamentos forçados travavam uma
batalha quanto a transição dessas vítimas de país em país ainda durante o período da primeira
guerra, eles não eram reconhecidos como parte da sociedade acolhedora, sua presença era
sentida como uma ameaça. O sentimento de insegurança e medo foi preponderante para que
a comunidade internacional passasse a elaborar mecanismos que pudessem garantir a
segurança da comunidade.
Apesar de entendermos que os conflitos são reconfigurados com o passar do tempo,
o sentimento de insegurança também passa a ter uma dimensão distinta. Se após o término
das duas Guerras Mundiais que contribuíram com o fluxo de pessoas se deslocando causaram
o sentimento de pânico, na contemporaneidade tal insegurança torna-se ainda mais latente
devido à globalização, por meio do seu dinamismo é notório que as transformações ocorrem
em toda estrutura, sendo ela econômica, social, cultural e política. A problemática da crise de
refugiados, de cunho transnacional, exigiu do Estado uma manifestação, com isso temos os
documentos internacionais, que por meio de suas diretrizes expõe os métodos de tratamento

62

que cada grupo, seja ele migrante, apátrida ou refugiado devem receber conforme sua
particularidade. Contudo, o apoio aos refugiados está além dos auxílios burocráticos, a crise
de refugiados exige não apenas o acolhimento ou identificação jurídica, mas se faz necessário
compreender que há um processo longo de socialização.
Tal processo, exigirá da comunidade receptora uma noção a respeito desse indivíduo
que será inserido a comunidade local. Pontuo aqui os fatores que ainda devem ser quebrados
para que haja uma melhor inserção e percepção a respeito dessas vítimas. É indispensável que
os nativos possam compreender a definição jurídica da terminologia, como também um
melhor esclarecimento dos meios de comunicação a respeito da distinção que há entre os
conflitos de deslocamento. Apesar do Brasil aparentar ser um país acolhedor, observamos que
na prática essa realidade apresenta-se de forma contrária.
Ao longo dos três capítulos abordamos a respeito da crise de refugiados numa
perspectiva internacional e nacional, para assim compreendermos melhor sobre o
desenvolvimento dessa crise, discorremos também sobre os documentos e regulamentos
essenciais como a Convenção de 1951, Declaração de Cartagena, Lei nº 9.474/97 e a Nova
Lei de migração, para a compreensão desse fenômeno, discorremos também a respeito das
instituições que desempenham atividades em auxílio aos refugiados.
Por fim, diante de tudo que já foi apresentado, se faz necessário a continuação de
mais pesquisas na área de Ciências Sociais, que se debrucem a investigar e analisar a atual
crise e sua configuração, visando a ampliação de discussões no âmbito acadêmico.
Ressaltando a importância em dar continuidade com o aperfeiçoamento da pesquisa,
possibilitando a comunidade acadêmica e civil um melhor entendimento a respeito desse
cenário.

63

BIBLIOGRAFIA

ALMEIDA, G. A. . A Lei 9.474 e a definição ampliada de refugiado: breves considerações.
In: ARAÚJO, Nádia de; ALMEIDA, Guilherme Assis de.. (Org.). O direito internacional dos
refugiados: uma perspectiva brasileira. Rio de Janeiro: Renovar, 2001, v. , p. 154-167.
AGIER, Michel. Refugiados diante da nova ordem mundial. Tempo soc. [online]. 2006,
vol.18, n.2, pp.197-215. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/ts/v18n2/a10v18n2.pdf
ALMEIDA, M. H. L. V. B. . Guerra é paz: Cenário midiático e a dissimulação do Biopoder e
o princípio da liberdade de expressão. In: COPRECIS, 2017, CAMPINA GRANDE. Anais
COPRECIS. campina Grande: REALIZE, 2017. v. 1.
ANDRADE, J. H. Fischel de . O Brasil e a Organização Internacional para Refugiados (19461952). Revista Brasileira de Política Internacional , v. 48, p. 60-96, 2005.
BAENINGER, Rosana ; Mariana Aydos ; DOMINGUES, Juliana Arantes . Condições de
Vida da População Refugiada no Brasil: trajetórias migratórias e arranjos familiares. In: III
Congreso de La Asociación Latino Americana de Población ? ALAP, 2008, Córdoba Argentina. III Congresso de La Asociación Latino Americana de Población ? ALAP. Rio de
Janeiro: ALAP, 2008.
BAUMAN, Zygmunt, 1925- B341m Medo líquido / Zygmunt Bauman; tradução, Carlos
Alberto Medei- ros. — Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2008.
BAUMAN, Zygmunt. Estranhos à nossa porta/Zygmunt Bauman; tradução Carlos Alberto
Medeiros.- 1.ed.-Rio de Janeiro: Zahar, 2017.
BAUMAN, Zygmunt. Globalização: as consequências humanas. Tradução de Marcus
Penchel. Rio de Janeiro: Zahar, 1999.
BRITO, Angela Xavier. Habitus de migrante: um conceito que visa captar o cotidiano dos
atores
em
mobilidade
espacial.
Disponível
em:
http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102-69922010000300002
BRAGA, Jorge Luiz Raposo . Os campos de refugiados: um exemplo de "espaços de exceção"
na política contemporânea. In: 3 Encontro Nacional de Relações Internacionais, 2011, São
Paulo. Governança global e novos atores, 2011.
BRITO, Fausto. A politização das migrações internacionais: direitos humanos e soberania
nacional. Rev. bras. estud. popul. [online]. 2013, vol.30, n.1, pp.77-97.
BARTELEGA, C. F. . I A Assistência Internacional aos Refugiados - da Liga das Nações ao
Pós-Guerra Fria. 2007
Convenção
de
1951.
Disponível
em:
http://www.direitoshumanos.usp.br/index.php/Refugiados-Asilos-Nacionalidades-eAp%C3%A1tridas/convencao-de-genebra-relativa-ao-estatuto-dos-refugiados.html

64

BARROS, A. T. . Sociologia da mídia: principais perspectivas e contrapontos. Século XXI Revista de Ciências Sociais , v. 5, p. 186-222, 2015. Disponível em:
https://periodicos.ufsm.br/seculoxxi/article/view/19661/11659
BERGER, Peter L. LUCKMANN, Thomas. A construção social da realidade: tratado de
sociologia do conhecimento. Rio de Janeiro: Editora Vozes, 2004.

CONVENÇÃO RELATIVA AO ESTATUTO DOS REFUGIADOS (1951). Disponível em:
http://www.acnur.org/fileadmin/scripts/doc.php?file=fileadmin/Documentos/portugues/BDL
/Convencao_relativa_ao_Estatuto_dos_Refugiados
CONVENÇÃO DA ORGANIZAÇÃO DE UNIDADE AFRICANA (OUA)
QUE
REGE
OS
ASPECTOS
ESPECÍFICOS
DOS PROBLEMAS DOS REFUGIADOS EM ÁFRICA. Disponível em:
http://www.refugiados.net/cid_virtual_bkup/asilo2/2couaapr.html#a1
Comissão da Justiça e Paz de São Paulo. Disponível em: http://agemt.org/?p=4817. Acesso
em 25 de jan. de 2018.
DADOS
SOBRE
REFÚGIO
NO
BRASIL:
Disponível
em:
http://www.acnur.org/portugues/recursos/estatisticas/dados-sobre-refugio-no-brasil/
DANNER, F. . O Sentido da Biopolítica em Michel Foucault. ESTUDOS FILOSÓFICOS
(IMPRESSO) , v. 04, p. 191-210, 2010.
Elias, Norbert, 1897-1990. A sociedade dos indivíduos/Norbert Elias; organizado por Michael
Schröter; tradução, Vera Ribeiro; revisão técnica e notas, Renato Janine Ribeiro.- Rio de
Janeiro: Jorge Zahar Ed., 1994.
FOLHA UOL: GOVERNO BRASILEIRO QUER ACOLHER ATÉ 20 MIL REFUGIADOS
SÍRIOS POR ANO. Disponível em: http://www1.folha.uol.com.br/mundo/2016/05/1769930governo-brasileiro-quer-acolher-ate-20-mil-refugiados-sirios-por-ano.shtml ,
FLORES, M. C. S. . A função social do alto comissariado das Nações Unidas para refugiados
no Brasil. Âmbito Jurídico , v. 129, p. 1-2, 2014.
FOUCAULT, Michel. Vigiar e Punir: Nascimento da prisão; tradução de Raquel Ramalhete.
35. Ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2008-288p.
GASTALDO, E. L. ; BRITTOS, Valério . Mídia, Poder e Controle Social. Alceu(PUCRJ) , v.
7, p. 121-133, 2006.
HAYDU, M. . O envolvimento do Brasil com a problemática dos refugiados. Ponto-e-vírgula
(PUCSP) , v. 6, p. 183-200, 2010.
JUBILUT, L. L. . O procedimento de concessão de refúgio no Brasil 2007 (Artigo em Meio
Eletrônico - site do Comitê Nacional para Refugiados (CONARE)).

65

Jessica Kindlein Angioletti. INTERSEÇÕES JURÍDICAS DA MOBILIDADE HUMANA
DOS VENEZUELANOS AO. BRASIL: ENTRE O REFÚGIO E A PROTEÇÃO
COMPLEMENTAR.
LAGO, L. A. C. . Da Escravidão ao Trabalho Livre: Brasil, 1550-1900. 1ª. ed. São Paulo: Cia
das Letras, 2014.
JAROCHINSKI SILVA, J. C. . MIGRAÇÃO FORÇADA DE VENEZUELANOS PELA
FRONTEIRA NORTE DO BRASIL. In: 41º Encontro Nacional da ANPOCS, 2017,
Caxambu. Anais do 41º Encontro Nacional da ANPOCS, 2017. v. 1. p. 1-22.
LEI
Nº
13.445,
DE
24
DE
MAIO
DE
2017.
Disponível
http://www2.camara.leg.br/legin/fed/lei/2017/lei-13445-24-maio-2017-784925publicacaooriginal-152812-pl.html

em:

MOREIRA, J. B. . O Acolhimento dos Refugiados no Brasil: políticas, frentes de atuação e
atores envolvidos. 2007. (Apresentação de Trabalho/Outra).
MOREIRA, J. B. . Refugiados no Brasil: reflexões acerca do processo de integração local.
REMHU (Brasília) , v. XXII, p. 85-98, 2014.
Moradia e trabalho são principais desafios para refugiados no Brasil.. Disponível em:
http://www.acnur.org/t3/portugues/noticias/noticia/moradia-e-trabalhosao-principaisdesafios-para-refugiados-no-brasil/
MELO, L. F. A. Em Busca do Protagonismo: O Brasil e a Tentativa de Um Assento
Permanente no Conselho da Liga das Nações. 2015.
MAGALHÃES, G. M. . As populações migrantes e alteridade: notas e reflexões a partir dos
deslocamentos populacionais contemporâneos. Aurora (UNESP. Marília) , v. 07, p. 1, 2013.
MENDONÇA, R. F. ; TEMER, A. C. R. P. . A agenda setting: os meios de comunicação como
construtores da realidade social. Comunicação & Informação , v. 18, p. 192-207, 2015.
MARX, Karl; ENGELS, Friedrich. Manifesto do Partido Comunista. Trad. Sergio Tellaroli.
São Paulo: Penguin Group: Companhia das Letras, 2012. Disponível em:
https://edisciplinas.usp.br/pluginfile.php/4205994/mod_resource/content/0/Marx_EngelsManifesto%20do%20Partido%20Comunista_trad%20S.Tellaroli.pdf
NUNES, Francivaldo Alves. Colonização agrícola e núcleos coloniais nas terras de florestas
da Amazônia Oriental (Pará, século XIX). Aedos: Revista do Corpo Discente do Programa de
Pós-Graduação em História da UFRGS (Online), v. 2, p. 137-161, 2009. Disponível em:
http://seer.ufrgs.br/aedos/article/view/10587/6230. Acessado em 27 de jan. 2018.
O que é a Convenção de 1951?. Disponível em: http://www.acnur.org/portugues/informacaogeral/o-que-e-a-convencao-de-1951/
OLIVEIRA, ANTONIO TADEU RIBEIRO DE . Nova lei brasileira de migração: avanços,
desafios e ameaças. REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS DE POPULAÇÃO
(IMPRESSO) , v. 34, p. 171-179, 2017.

66

O Brasil e o espírito da Declaração de Cartagena.
http://www.fmreview.org/sites/default//files/disability/FMR35brasil.pdf

Disponível

em:

OLING, M. A. Biopolítica. Imigração e Refúgio: A construção da vida nua e o campo através do estado
de
exceção.
UNIJUÍ,
2017.
Disponível
em:
https://publicacoeseventos.unijui.edu.br/index.php/conabipodihu/article/view/9321/7991
PAULA, Gabriela. Refugiados: a representação do Outro pelo jornalismo. Disponível em:
periodicos.ufpb.br/index.php/tematica/article/download/31072/16294
PAIVA, Odair da Cruz. Refugiados da Segunda Guerra Mundial e os Direitos Humanos, 2009.
Disponível em: http://diversitas.fflch.usp.br/node/2180. Acesso em 01 de Março de 2018.
PENNA FILHO, Pio. Segurança Seletiva no Pós-Guerra Fria: uma análise da política e dos
instrumentos de segurança das Nações Unidas para os países periféricos - o caso africano.
Revista Brasileira de Política Internacional, Brasília, v. 47, n.1, p. 31-50, 2004. Disponível
em:
http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S003473292004000100003&script=sci_arttext&tlng=es
RODRIGUES, Daniel Lago ; MIALHE, J. L. . A Participação e Retirada do Brasil da Liga
das Nações. Cadernos de Direito , Piracicaba, SP, v. 2, n.4, p. 155-165, 2003.
REIS, Rossana Rocha ; MOREIRA, J. B. . Regime internacional para refugiados: mudanças
e desafios. Revista de Sociologia e Política (UFPR. Impresso), v. 18, p. 17-30, 2010.
REFÚGIO
EM
NÚMEROS
2010-2016.
Disponível
em:
http://www.justica.gov.br/news/brasil-tem-aumento-de-12-no-numero-de-refugiados-em2016/20062017_refugio-em-numeros-2010-2016.pdf/view
REFÚGIO EM NÚMEROS, 2017. Disponível em: http://www.justica.gov.br/news/de-10-1mil-refugiados-apenas-5-1-mil-continuam-no-brasil/refugio-em-numeros_1104.pdf/view
SIMMEL, Georg, 1858-1918 2. Sociologia I. Morais Filho, Evaristo de, 1914- II. Título.
SUZUKI, L. S. A. . Brasil e a migração internacional no século XXI: uma análise da inserção
de mão de obra estrangeira no mercado de trabalho brasileiro. 2012.
Souza, Fabrício Toledo A crise do refúgio e o refugiado como crise/ Fabrício Toledo de Souza;
orientador: Francisco de Guimaraens. Departamento de Direito. Rio de Janeiro, 2016.
SCREMIN, LIEGE . Conflitos Contemporâneos: A Categoria Refugiado no Telejornalismo Brasileiro.
In: EVINCI, 2016, Curitiba. Anais do Evinci, 2016.
TZASCHEL, Azevedo Luiza. A tutela jurídica internacional de refugiados e apátridas. 2012.
Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação em centro de ciências jurídicas) - Universidade
Federal de Santa Catarina.
Tratado de sociologia / sob a direção de Raymond Boudon, com a colaboração de J. Baechler...
[et ai]; tra-dução de Teresa Curvelo; revisão técnica-de Renato Lessa. - Rio de Janeiro: Jorge
Zahar Ed., 1995604p.Tradução de: Traité de sociologie ISBN 85-7110-339-9 l. Sociologia. I.
Boudon, Raymond.

67

WALDELY, ARYADNE BITTENCOURT; VIRGENS, BÁRBARA GONÇALVES DAS;
ALMEIDA, CARLA MIRANDA JORDÃO DE. Refúgio e realidade: desafios da definição
ampliada de refúgio à luz das solicitações no Brasil. REMHU (Brasília), v. 22, p. 117-131,
2014.